Publicado em: 28/05/2008
Indústria do tabaco na Justiça para voltar a anunciar em rádios, emissoras de TV e outros veículos. ACT requer seu ingresso na Ação Direta de Inconstitucionalidade impetrada pelas empresas, exigindo a manutenção do veto à publicidade. Também pede a proibição total de qualquer tipo de promoção de cigarros
Para garantir que a lei 10.167/2000 -- que proibiu a publicidade de produtos de tabaco em TVs, rádios, revistas, jornais, Internet, outdoors -- continue a ser cumprida, a Aliança de Controle do Tabagismo (ACT) vai requerer amanhã, 27 de maio, em Brasília, seu ingresso na ADIN como terceiro interessado ('amicus curiae'), assim como outras entidades já fizeram. A ACT tem a convicção de que a volta da veiculação dos anúncios de cigarros é um passo atrás em relação ao avanço que o país conquistou em termos de controle do tabagismo.
Essa ameaça à lei 10.167/2000 se deve à Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN), impetrada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) junto ao Supremo Tribunal Federal, com o objetivo de liberar a propaganda de cigarros. A CNI questiona a legislação com o argumento de que ela feriria a Constituição Federal, por interferir na liberdade de manifestação comercial. Essa ação também quer retirar as advertências sobre os malefícios do cigarro de suas embalagens e peças publicitárias. A ACT vê tal iniciativa como uma ameaça à atual lei 10.167/2000 – e à saúde pública. Portanto, exige que as autoridades competentes mantenham as restrições à publicidade, conforme a lei 10.167/2000, e julguem a ADIN improcedente.
O ingresso da ACT na ADIN acontece justamente na semana de 31 de maio, Dia Mundial sem Tabaco. Neste ano, em particular, a Organização Mundial da Saúde aproveita a data para colocar a indústria do tabaco em xeque. Em todo o planeta será deflagrada uma ampla campanha para proibir definitivamente todas as formas de propaganda e promoção do tabaco. A ação é focada inicialmente no público jovem, mas há a consciência de que a eliminação total da propaganda do fumo é fundamental para evitar a propagação do mal em todos os públicos, em todas as faixas etárias.
"A norma é evidentemente constitucional. A tendência mundial é proibir totalmente a publicidade de cigarros. Seria um retrocesso perante as conquistas em termos de saúde pública e de políticas de controle do tabagismo. Sem falar na própria Convenção Quadro, ratificada pelo Brasil, e que prevê a proibição total da publicidade", diz Paula Johns, diretora-executiva da ACT.
De fato, o artigo 13 de Convenção Quadro para o Controle do Tabaco, o primeiro tratado internacional de saúde pública, promovido pela OMS e adotado pelo Brasil, preconiza a proibição total de qualquer tipo de publicidade e promoção, inclusive nos pontos de venda.
Também neste dia 27, a OMS estará entregando ao governo brasileiro um diagnóstico sobre a política nacional de controle do tabagismo com uma série de recomendações. Há duas semanas no Brasil, uma missão de especialistas nacionais e internacionais da OMS analisou a capacidade nacional em controle do tabagismo. Esta é a primeira avaliação feita no mundo e o Brasil foi o país piloto. Agora, a análise será replicada em outros países. Integrantes da ACT participaram da missão na qualidade de especialistas nacionais sobre o tema.
A EXPOSIÇÃO DE JOVENS À PROPAGANDA DO TABACO
É sabido que a maioria das pessoas começa a fumar antes de 18 anos e quase um quarto delas usa tabaco antes dos 10. Quanto mais novo for o jovem a experimentar o fumo, mais propenso está a se tornar usuário e menores são as possibilidades de parar de fumar.
Está claramente provado que a exposição direta ou indireta à propaganda de tabaco, junto com outras estratégias de marketing usadas pela indústria, leva a um aumento da experimentação entre os jovens e, por conseguinte, a um risco real de se tornarem usuários regulares de produtos de tabaco. A indústria gasta, em todo o mundo, 10 bilhões de dólares por ano para vender seus produtos de todas as maneiras possíveis.
Hoje a propaganda direta ou indireta é feita de várias formas: na televisão, rádio, Internet, revistas, banners, pôsteres; correio, cupons, outdoors, programas de fidelidade da marca, patrocínio de esportes e eventos culturais, revistas de circulação controlada distribuídas pela indústria e até brindes para estimular o consumo.
No Brasil, desde 2000, por meio da lei 10.167, a propaganda é proibida na TV, em rádios, jornais, revistas, outdoors, banners, pôsters, mas é permitida nos pontos de venda. Por isso, cada vez mais a indústria investe nesses locais, com material atraente especialmente para jovens e com a criação de abordagens diferenciadas, como a ação de promotores de seus produtos em bares e baladas. Também é proibido o patrocínio de eventos esportivos e culturais por marcas de cigarros, mas para burlar essa restrição, a indústria vem investindo cada vez mais em patrocínio institucional e em atividades convenientemente denominadas de Responsabilidade Social Empresarial (RSE).
MENSAGEM DA OMS
Em resposta à ameaça aos jovens e a toda a sociedade, este ano o Dia Mundial Sem Tabaco traz uma mensagem contundente:
Um dos meios mais eficazes dos países protegerem seus jovens da experimentação e de se tornarem fumantes é proibir todas as formas de propaganda de tabaco, direta ou indireta, incluindo a promoção e o patrocínio de eventos pela indústria.
A cruzada iniciada pela OMS deve-se ao fato de cerca de metade das crianças do mundo viverem em países que não proíbem a distribuição de amostra grátis de produtos de tabaco e a publicidade. Aliás, estudos de diversas nações, antes e depois da proibição de propaganda, atestam uma queda no consumo de mais de 16%.
O Estudo Global do Tabagismo entre os Jovens, realizado pela OMS em 46 países, revelou um quadro alarmante de dependência prematura. Em algumas áreas da Polônia, de Zimbábue e da China, crianças de 10 anos de idade já estão dependentes do tabaco.
No Brasil este mesmo estudo foi realizado entre estudantes de 12 capitais brasileiras, em 2002 e 2003, e encontrou uma prevalência de experimentação variando de 36 a 58% no sexo masculino e de 31 a 55% no sexo feminino. De acordo com o mesmo estudo brasileiro, a prevalência de escolares fumantes atuais variou de 11 a 27% no sexo masculino e 9 a 24% no feminino.
OS MALEFÍCIOS DO TABACO E SEU PODER MORTAL
O tabaco é a primeira causa de mortes no mundo, apesar de ser totalmente passível de prevenção. É o único produto legal de consumo que mata metade dos usuários, seguindo as instruções dos fabricantes, com suas vítimas morrendo prematuramente (cerca de 15 anos antes).
Há aproximadamente 1.8 bilhão de jovens (com idades entre 10-24 anos) no mundo, sendo que mais de 85% estão em países em desenvolvimento. Tendo sobrevivido às doenças vulneráveis à infância, estes jovens são geralmente saudáveis.
Entretanto, como a indústria do tabaco intensifica seus esforços para alcançar usuários novos e com potencial de fumar por longo período, a saúde de uma porcentagem significante da juventude do mundo está seriamente ameaçada.
A nicotina é uma substância altamente adictiva e a experimentação por crianças e adolescentes pode facilmente levá-los à dependência por toda a vida.
UM CHAMADO À RESPONSABILIDADE SOCIAL
A ACT chama a atenção de ONGs, dos jovens, da população em geral e das autoridades governamentais sobre o uso da expressão Responsabilidade Social Empresarial (RSE) pela indústria do tabaco, tema de grande importância nas maiores economias mundiais.
Nos anos 90, por força da legislação e de processos judiciais nos Estados Unidos e na Europa, a indústria do tabaco começou a rever seu discurso e passou a assumir, com moderação, que o cigarro traz riscos ao ser consumido. Para recuperar a imagem desgastada, começou a investir em RSE. Atualmente, é rotina pautarem o debate sobre o tema e caminharem no sentindo de convencer que não há nenhum problema em relacionar RSE com a fabricação e comercialização de um produto que provoca adoecimento, morte e uma série de impactos sociais, ambientais e econômicos.
Portanto, pedimos uma reflexão:
″ O patrocínio de eventos culturais e esportivos por marcas de cigarros é proibido por lei. A proibição do patrocínio desses mesmos eventos usando a marca institucional da empresa não está clara. Não é curioso que a maior empresa de cigarros do país, a Souza Cruz, passe a investir na série Diálogos Universitários, levando às maiores universidades do país personalidades incontestavelmente atraentes para o público jovem?
″ Quando promove esses eventos, veicula vídeo institucional com seus projetos em RSE, mas que na verdade embutem a mensagem de diversidade de opinião, de cada um ter liberdade de fazer o que quer, ou seja, fumar é uma escolha pessoal, quando na verdade sabemos que é dependência química.
″ Nesses vídeos, também veicula a informação de que a empresa paga muitos impostos. Não é verdade. Há espaço para aumento, o que faria subir os preços dos maços, medida comprovadamente capaz de reduzir o consumo. Estudo feito para a ACT, coordenado pelo economista Roberto Iglesias, mostrou que entre 1998 (ano em que houve uma mudança no IPI) e 2007, a arrecadação anual real do IPI–Cigarro caiu quase 40% em termos reais – em preços de 2007, o equivalente a 1,8 bilhões de reais de 2007. O estudo está disponível em www.actbr.org.br
″ Pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz analisou 32 doenças, entre diferentes tipos de câncer e problemas dos aparelhos circulatório e respiratório. Os custos totais atribuíveis ao tabagismo no Brasil, em um ano, ultrapassaram os R$ 330 milhões para pacientes com 35 anos ou mais. Enquanto isso, de acordo com seu relatório anual de 2007, o lucro líquido da Souza Cruz foi de R$ 908,1 milhões, sendo 10,2% superior aos R$ 824,1 milhões registrados em 2006.
″ Abordar jovens em baladas e bares, convidando-os para eventos exclusivos para fumantes; vender gadgets como carteiras de cigarros, latas, bonés, mochilas, junto com cigarros, não é ser socialmente responsável: é marketing. O velho, puro e simples marketing.
Por isso, cabe aos legisladores:
″ Uma lei abrangente que proíba todas as formas de propaganda, promoção e patrocínio de produtos de tabaco. A auto-regulamentação, com regras não consagradas em leis, não funcionam e não é uma resposta aceitável para proteger a população, especialmente jovens, das táticas de marketing da indústria.
″ Implementação de políticas e programas que não tenham apenas jovens como público alvo. Intervenções que tenham a população como um todo, como proibição de todas as formas de propaganda de tabaco, aumento dos impostos sobre produtos de tabaco e criação de ambientes 100% livres de fumo têm um sucesso maior em reduzir o uso do tabaco entre os jovens.
Cabe aos Jovens:
Transmita aos legisladores de seu país o que você pensa. Defenda a proibição total da propaganda, promoção e patrocínio de produtos de tabaco.
Envolva-se numa campanha para educar os amigos sobre como a indústria do tabaco usa técnicas de marketing para persuadir as pessoas a fumar. Deixe a indústria saber que você não será enganado por táticas de pretensa "esperteza" e investimentos altos em promoção.
Cabe às ONGs:
″ Defender junto aos legisladores uma proibição completa da propaganda, promoção e patrocínio dos produtos de tabaco em seu país.
″ Ajude a organizar grupos de jovens para que possam ser parte da campanha e os engaje na concepção, desenvolvimento, implementação, monitoramento e avaliação das políticas de controle do tabaco e programas para proibir propaganda, promoção e patrocínio de produtos de tabaco.
Cabe ao conjunto da sociedade:
Defender junto aos legisladores leis para proibir a propaganda, promoção e patrocínio de produtos de tabaco a fim de proteger os jovens.