Publicado em: 30/06/2008
Ronaldo Laranjeira, da Unifesp, acusa governo de omissão diante do maior consumo de álcool e drogas
O relatório do Escritório contra Drogas e Crime, da ONU, usou dados do governo brasileiro, com base na pesquisa do Centro Brasileiro de Informações Sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid) divulgada em 2005. Por isso, não são novidade para o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, professor do Departamento de Psiquiatria da Unifesp e coordenador da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas. Segundo ele, os dados revelam a "completa falta de ação do governo brasileiro diante do crescimento do consumo de álcool e drogas no País", sobre o qual já se sabe, pelo menos, há três anos.
"Se você me perguntar qual foi a política adotada pelo governo com relação à prevenção e tratamento de usuários de álcool e drogas, eu não saberia responder", desabafa. Para ele, o aumento do consumo no País se deve a fatores de mercado: "aumento da área plantada na América Latina, aprimoramento dos processos de produção e distribuição, o que fez também baratear o custo da droga." Conclusão do especialista: "Quando o tráfico aumenta a produção, aumenta o consumo no Brasil porque não existe rede de proteção social. É como se a sociedade não tivesse nada a fazer com relação ao assunto, colocando toda a culpa no tráfico. Agora, os traficantes querem aumentar seus negócios. E nós estamos à mercê desse mercado."
O médico Ricardo Abrantes do Amaral, do Grupo Disciplinar de Álcool e Drogas do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, compartilha da opinião. "O que o relatório revela de importante é que o comércio de drogas tem se estabilizado em algumas regiões mais desenvolvidas, como a Europa, mas cresce nos países em desenvolvimento, entre eles o Brasil. Como estamos na rota do tráfico e com economia aquecida, o País pode ter se tornado bom mercado para os traficantes, suprindo a queda do consumo na Europa. Pode ser que parte da droga que antes só passava pelo Brasil agora fique aqui."
Para o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, a melhor política para o Brasil seria
investir na prevenção do uso de drogas lícitas. "Quanto mais retardar o início do uso de álcool e cigarro, menor será a chance de o jovem partir para o consumo de maconha e cocaína. Não existem dúvidas sobre a relação entre drogas lícitas e ilícitas", diz o médico. Além de educação, isso seria possível por meio de pesquisas e identificação de grupos de risco e políticas focadas neles.
O governo brasileiro divulgou estar investindo nos Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps), administrados pelos municípios com verba federal. Mas, para Laranjeira, o atendimento nos centros é insuficiente. "É de uma ingenuidade atroz achar que se vai resolver o problema das drogas com os Caps. Veja o exemplo de São Paulo: não existe um leito sequer de internação para casos graves. Se os casos graves não são tratados, imagina os mais simples", ironiza o médico. "A realidade do Brasil é a seguinte: você tem novos consumidores, com acesso cada vez mais fácil à droga, enquanto os que já são usuários demoram para sair dessa porque não há tratamento."