Liberdade de expressão comercial? Isso não existe!

Publicado em:  02/10/2008

Por Marinilda Carvalho - Revista da FIOCRUZ

 

O Ministério da Saúde empenha esforço e tempo na regulamentação da propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias, como prevê o Parágrafo 4º do Art. 220 da Constituição. Criada em 1999, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a quem cabe essa regulação, já conseguiu conter algum excesso na publicidade do cigarro e da bebida de alto teor alcoólico, mas a pressão da indústria, das agências de publicidade e dos veículos de comunicação a impedem de restringir anúncios de medicamentos, cerveja, alimentos insalubres e até os dirigidos a crianças.

 

Essa reação articulada atingiu seu clímax em julho, no 4.º Congresso Brasileiro de Publicidade, organizado em São Paulo pela Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap). Mas no ano passado já mereciam destaque na mídia os sambistas Zeca Pagodinho e Alcione, que reagiram com agressividade à crítica do ministro da Saúde a artistas que propagandeiam cerveja. E os debates em torno da Consulta Pública n.º 84, sobre restrições a anúncios de remédios, vêm desde 2005.

 

O objetivo dessa consulta era a alteração do atual modelo regulador da propaganda de medicamentos, estabelecido em 2000 por resolução da diretoria colegiada da Anvisa (RDC 102). Resolução mais do que necessária: de 1995 a 2003, o Sistema Nacional de Informações Toxicológicas (Sinitox/Fiocruz) identificou nos medicamentos o principal agente de intoxicação humana em usuários do SUS. Em menos de três meses (novembro de 2005 a janeiro de 2006), a Anvisa recebeu 857 sugestões oriundas de 250 diferentes setores, que organizaram seminários e debates sobre o tema. A Gerência de Monitoramento e Fiscalização de Propaganda, Publicidade, Promoção e Informação de Produtos Sujeitos a Vigilância Sanitária (Gprop/Anvisa) afirma em relatório que incorporou 226 ao regulamento, 87 delas parcialmente.

 

Na verdade, o novo regulamento pouco altera o anterior, repleto de fragilidades na opinião do pesquisador da Ensp/Fiocruz Álvaro Nascimento, representante da Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (Abrasco) na Câmara Setorial de Propaganda da Anvisa: a agência só atua após a veiculação da peça publicitária, ou seja, a população já foi exposta a risco sanitário; o artigo mais infringido é o que obriga a citação das contra-indicações do remédio; e as multas são irrisórias: a Anvisa recolheu em 18 meses o equivalente a dois anúncios em horário nobre da TV — 0,1% dos gastos em publicidade de medicamentos no período.

 

Mais: quando estampa ao fim do anúncio a frase "Ao persistirem os sintomas o médico deverá ser consultado", a regulação estimula o consumo antes da consulta, o que é absurdo, já que lhe caberia educar a população para "antes de consumir qualquer medicamento, consultar um médico". É o que prega a Política Nacional de Medicamentos. "Esse modelo regulador beneficia o infrator", afirma Álvaro, mestre em Saúde Coletiva pela Uerj e autor do livro Ao persistirem os sintomas, o médico deverá ser consultado. Isto é regulação?, originado de sua dissertação.

 

A Anvisa não só descarta a principal proposta dos sanitaristas, antiga de 20 anos, a proibição da propaganda de medicamentos para o grande público — que já queriam inserida na Constituição de 88 —, como nenhuma das fragilidades apontadas foi eliminada: a regulação continuará a posteriori, as multas permanecerão ínfimas, podendo ser repassadas aos preços, e a frase que estimula o primeiro consumo estará nele inalterada. Segundo Álvaro, há até pontos inaceitáveis, como o art. 15, que permite a oferta de brindes a profissionais que prescrevem ou dispensam remédios.

 

Para o jornalista, será certamente desrespeitado o artigo 27, que determina que a publicidade em rádio e TV deixe claras indicações, contra-indicações, condições fisiológicas e disfunções orgânicas, cuidados e advertências. "Alguém acredita que a indústria e as agências gastarão vários minutos para fazer isso de forma correta?", pergunta. "Não farão, como não fizeram nos últimos 30 anos de tentativas de regulação, porque isso entra em choque com o objetivo maior da publicidade, que é a divulgação ampla dos benefícios do produto".

 

No congresso da indústria em São Paulo, esse objetivo óbvio da propaganda foi trocado pela defesa apaixonada de uma dita "liberdade de expressão comercial". A partir daí, regulação virou sinônimo de "censura"; a proteção do Estado ao cidadão acabou qualificada como "mania de tutela". Em 10 de julho, a Agência Câmara já anunciava em Brasília uma Frente Parlamentar de Comunicação Social, com 198 dos 513 deputados federais (38,6% do total) e 38 senadores dos 81 (47%), muito festejada no jantar de abertura do congresso paulistano, com presença de parlamentares. O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) foi voz dissonante. Ou há normas ou não se ganha a guerra pela educação, disse ao site Congresso em Foco. "Educação é escola, família e mídia: tanto programas quanto propaganda influenciam na formação".

O conceito de liberdade de expressão comercial, "apresentado e defendido por celebridades jurídicas no livrete Garantias constitucionais à liberdade de expressão comercial, publicado pelo Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária (Conar), em 2000, constituiu-se na principal bandeira dos interesses da 'indústria de 57 bilhões de reais/ano'", escreveu em artigo no Observatório da Imprensa (22/7) Venício A. de Lima, pesquisador de mídia e política da Universidade de Brasília.

 

A lição de casa foi feita. "Parece que agora os males do país estão representados pela publicidade e que vamos corrigir isso através da proibição de tudo", disse à Folha (7/7) Dalton Pastore, presidente da Abap, sobre a regulação da propaganda de alimentos de alto teor calórico, a mais recente bandeira da Anvisa em prol da saúde coletiva. "Parece que a gente não aprendeu muito com a ditadura". Para Pastore, regras são uma forma de o governo dizer que "as crianças, os pais, os professores, as pessoas em geral não têm vontade própria, não têm capacidade de decidir o que é melhor para elas e precisam que o Estado decida por elas".

 

O pensador Paul Virilio já entendia discursos como o do Sr. Pastore desde 1993, quando escreveu A arte do motor: "A publicidade chegou a saturar indistintamente todas as esferas do poder — esporte, ciência, filosofia, ética, cultura, ajuda humanitária —, sem contar as pressões que exerce sobre o próprio Estado democrático".

 

OS RELEASES DO JN

 

"Foi sintomática a cobertura do congresso pelo Jornal Nacional e o Jornal da Globo", avalia o pesquisador Rodrigo Murtinho, do Laboratório de Pesquisa em Comunicação e Saúde (Icict/Fiocruz). "As matérias pareciam releases do congresso, sempre contrárias à regulação". Rodrigo estuda a história da radiodifusão brasileira para sua futura tese de doutorado na UFF, sobre TV Pública, e conta que o rádio ditou o modelo regulatório de nossa TV. Da rádio-clube amadora passamos à comercial, que destinava 10% do tempo à propaganda. Isso cresceu para 25% na era Vargas, quando se consolidou o modelo pelo qual não mais se distinguia o interesse público do privado — inclusive na Rádio Nacional, apesar da preocupação educativa de então.

 

Chegavam nessa época ao Brasil as agências de publicidade americanas, acompanhando as grandes multinacionais. O modelo se transferiu para a TV, primeiro com Assis Chateaubriand, dos Diários Associados, donos da rádio e da TV Tupi, depois aprimorado pela Globo. "O principal telejornal do país se chamava Repórter Esso", recorda Rodrigo, que destaca: rádio e TV sempre foram concessões públicas. O processo de outorga e renovação das concessões pelo Congresso — que os especialistas do Observatório da Imprensa classificam de "coronelismo eletrônico", pelo qual políticos donos de emissoras decidem sobre as concessões, ou seja, legislam em causa própria — gera "briga de foice", que se estende à Câmara Setorial da Anvisa.

 

ATÉ O FUSO HORÁRIO

 

Ali, Abap e aliados combatem toda tentativa de regulação, enquanto a Globo confronta, onde necessário, qualquer restrição de conteúdo, como se viu na "guerra" da emissora com o Ministério da Justiça contra a classificação indicativa de faixa etária da programação. "A classificação saiu em 2007, mas a pressão foi tamanha que o governo mudou o fuso horário da fronteira oeste", ressalta Rodrigo. Ele se refere à lei que reduziu a diferença de horário do Acre e de 46 municípios do Amazonas em relação ao de Brasília de duas para uma hora. "A submissão do Congresso e do governo ao poder das Organizações Globo parece não ter limites", condenou o Observatório do Direito à Comunicação", para quem o projeto foi aprovado para que a Globo não precisasse adaptar suas novelas à Portaria 1.220.

 

Apesar de tudo, a Anvisa regula — "Se considerarmos o exemplo da área de comunicação, a Anatel...", compara Venício. A agência sabe que o direito à liberdade de expressão assegurado na Constituição não se aplica à publicidade. "Para nós é claro o que é liberdade de expressão e o que é propaganda: as coisas não se misturam", disse ao Congresso em Foco Maria José Delgado, que coordena a regulamentação da propaganda na agência. Segundo ela, a publicidade se enquadra nos direitos econômicos constitucionais, e esse discurso "pode engessar o processo de regulamentação".

 

Mesmo em se admitindo uma "liberdade de expressão publicitária" seria necessário avaliar o que é mais importante: veicular a publicidade, garantindo a liberdade de expressão, ou proteger outros direitos e valores que podem ser prejudicados por ela, argumentam no artigo "Liberdade de expressão publicitária, uma falsa discussão" (Observatório da Imprensa, 22/7) a advogada Paula Ligia Martins e a jornalista Maíra Magro, do escritório no Brasil da Article 19, agência de defesa da liberdade de expressão (assunto do Art. 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU).

 

Com toda a pressão, o regulamento da propaganda de remédios acabou modesto, mesmo tendo a Anvisa reconhecido em 2005 que 90% da propaganda farmacêutica contêm irregularidades. Venício lembra à Radis que "anunciantes, agências e mídia são o próprio capital", e recomenda a quem se interesse em aprofundar o tema a leitura do artigo de Maria Eduarda Rocha "O canto da sereia — Notas sobre o discurso neoliberal na publicidade brasileira pós- 1990" (Revista Brasileira de Ciências Sociais, nº 64). "O poder de pressão deles é fantástico". Tanto que "todos os argumentos da indústria foram incorporados", diz Álvaro. A proposta dos técnicos da agência visando "melhorar" a propaganda foi uma oficina para que publicitários e jornalistas se "conscientizem" dos males da propaganda farmacêutica enganosa e "resistam" em suas empresas aos interesses dos patrões, critica.

 

Álvaro Nascimento, pela Abrasco, Silvia Vignola, pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), e José Ruben Bonfim, pela Sociedade Brasileira de Vigilância de Medicamentos (Sobravime), divulgaram em 26 de junho nota criticando o processo de avaliação das sugestões à CP 84, distribuída no dia 30 aos 300 participantes da audiência pública da Anvisa.

 

Foram rejeitadas as 19 proposições da Oficina de Trabalho sobre Regulação da Propaganda de Medicamentos, organizada pela Ensp/Fiocruz e o Centro de Vigilância Sanitária da Secretaria de Saúde do RJ, sugeridas por 12 instituições e 146 pesquisadores "de reconhecida capacidade na área da Assistência Farmacêutica e Uso Racional de Medicamentos", dizia a nota, segundo a qual as alterações do novo regulamento são "superficiais e insuficientes", o que obrigará o país a rever a resolução em breve. "Chega-se ao fim do processo com a preservação dos poderosos interesses do setor regulado", o que "colide com o verdadeiro papel de uma agência de regulação que pretenda ser instrumento de formulação de políticas que protejam a sociedade (...) do que, no plano internacional, se considera risco sanitário".

 

A anuência prévia, segundo a nota, é propugnada pela União Européia, posta em prática em países como França, Inglaterra, Espanha e Suíça, além de Austrália e outros. "Afirmar que um controle maior da publicidade farmacêutica é retrocesso democrático, pois feriria a 'liberdade de expressão comercial', significa estar na contramão do que existe de mais expressivo nesta área nas sociedades mais avançadas". Na audiência de 30/7, confrontado com este argumento, um representante da indústria fingiu de morto: "Não conheço essas legislações". Álvaro entregou-lhe em mãos a documentação. A maior prova de que as alterações são insuficientes, diz a nota, está no apoio do setor regulado, que tem grande número de representantes entre os 36 integrantes da Câmara Setorial.

 

 

Em entrevista ao fim da audiência pública, o diretor-presidente da Anvisa, Dirceu Raposo de Mello, prometeu reavaliar a proposta da anuência prévia — avaliação do anúncio antes que entre em circulação. Mas nada aconteceu: em agosto, a agência ainda "refletia" sobre o assunto. Não marcou nova audiência, não botou o novo regulamento em vigor. Enquanto isso, a indústria e seus representantes no Congresso mantinham o bombardeio contra a regulação.

 

Rodrigo Murtinho ressalta o empenho do setor regulado, que chegou a "ressuscitar" um evento — o 3º Congresso de Publicidade ocorreu há 30 anos, na criação do Conar — para frear a regulação. "Trouxeram até o Kofi Annan para explorar a imagem de defesa das liberdades associada à ONU, já que poucos conhecem o atual secretário-geral, Ban Ki-moon", ironiza.

 

Paula Martins e Maíra Magro desmontam várias distorções nos argumentos da indústria: ao garantir a liberdade de expressão, a Constituição quis assegurar a manifestação de idéias e convicções individuais ou da coletividade. "Publicidade não se trata disso: seu fim não é expressar uma convicção ou uma informação, mas vender", resumem. "O titular da liberdade de expressão como direito fundamental é sempre o indivíduo ou a coletividade, não as empresas". E quem define os limites da regulamentação é a própria sociedade, defendem as articulistas.

 

ARGUMENTO FALACIOSO

 

Nem mesmo o direito à informação é violado com a restrição da propaganda. "Este é um argumento falacioso. Embora a publicidade possa ter algum conteúdo informativo, sua intenção final não é informar, mas convencer o consumidor a comprar algo", sustentam. "Se a publicidade tivesse por objetivo final informar, publicitários e anunciantes teriam aplaudido as propostas da Anvisa de inserir nos anúncios de certas bebidas e alimentos dados sobre riscos à saúde".

 

"A Federação Nacional dos Jornalistas até deveria se pronunciar a respeito da confusão de liberdades, a jornalística e a publicitária", opina Venício Lima. José Carlos Torves, diretor da Fenaj, concorda: a entidade já debateu a questão e deve mesmo condenar a mistura de princípios.

 

O jornalista Maurício Azedo, presidente da ABI, já condenou. "A Associação Brasileira de Imprensa considera que interesses comerciais, mascarados por invocações à liberdade de expressão, não podem sobrepor-se ao interesse da saúde da população, que tem de ser protegida contra demasias cometidas pela exploração publicitária, sobretudo nos meios eletrônicos de comunicação", anuncia à Radis. "Embora seja importante e eficaz a auto-regulamentação, o Poder Público não pode abdicar de seu direito e de sua obrigação de legislar em defesa da população".

 

Rodrigo Murtinho vai além. "As entidades de defesa de direitos — à saúde, à informação, à liberdade de expressão, à democratização da comunicação — todas deveriam se unir e cobrar a regulamentação da publicidade", diz. "Mais que isso até, o controle social dessa atividade".

 

De fato, sob pressão da indústria, a posição do Estado fica difícil, já que a própria sociedade civil não se manifesta, opina o jornalista Ivson Alves, que há 12 anos faz crítica da mídia em seu site Coleguinhas, uni-vos. "O poder não admite vácuo: se a sociedade civil não fala será vocalizada por esses grupos", alerta. "E sem esse respaldo a Anvisa fica sem armas para reagir". Ivson cita também o em torno do projeto de lei que trata do conteúdo nacional da programação na TV por assinatura, o PL 29. A ABTA, associação empresarial do setor, veiculou anúncio dirigido ao assinante, denunciando que "querem restringir sua liberdade de escolha". Como se o assinante tivesse alguma: "Essa desfaçatez é permitida pela falta de contrapressão".

 

Segundo o jornalista, falta articulação aos sanitaristas. "O ministro Temporão, por exemplo, vem sofrendo uma espécie de marinização na mídia, mas a ministra Marina Silva tinha respaldo público dos ambientalistas: se perdeu algumas brigas, venceu outras graças a isso", salienta. "Hésio Cordeiro, Sergio Arouca, esse pessoal tinha a visão da necessidade do acesso à mídia e da articulação da sociedade civil na defesa da reforma sanitária, mas isso se perdeu", entende ele. "Não se pode deixar de combater nessa arena, a discussão técnica precisa chegar à mídia, ou já se entra no jogo perdendo". Para Ivson, é preciso ser frio e usar as "armas do inimigo": escolher três ou quatro pessoas articuladas, que se expressem bem, que façam curso de media training. "É só dar um tempo para surtir efeito", aposta, mencionando como exemplo o jornalista Paulo Adário, coordenador internacional do Greenpeace na Amazônia: a ONG cria problemas para empresas, estatais, governo, mas o discurso de seu representante conquistou credibilidade e espaço.

 

A pesquisadora Ivana Bentes, diretora da Escola de Comunicação da UFRJ, acha o mesmo: "Se não der esse passo para fora da corporação, nada acontece". Essas questões apareceram em junho no Fórum de Mídia Livre, que debateu democratização da comunicação e das verbas publicitárias. "A sociedade precisa se mobilizar, ou sanitaristas e ambientalistas continuarão apresentados como inimigos da sociedade", diz. Para ela, é urgente o debate sobre publicidade e degradação da saúde, publicidade e alcoolismo, publicidade e delinqüência, que aqui jamais avançou. "A publicidade não é um determinante automático, mas legitima o consumo de álcool, de remédios, o consumismo infantil, e a Anvisa, sem respaldo, recua: só pela justeza da causa a regulação não sai".

 

RESPOSTA AO ABUSO

 

Ivana lembra que essa indústria desdenha o exemplo regulador europeu, historicamente consolidado, e prega o modelo americano. "Mas, convenientemente, esquece: se os Estados Unidos são o berço do discurso da liberdade comercial, também o são da resposta da sociedade ao abuso", ressalta. Nessa guerra de discursos, os americanos protestam, boicotam produtos, recorrem à Justiça. Um dos processos mais recentes clama contra o aumento do tamanho das embalagens, a da pipoca, por exemplo, agora vendida em baldes. "A praga chegou por aqui e logo importaremos também epidemia de obesidade".

 

"Não temos nem o discurso regulador europeu nem o discurso de resposta a essa publicidade predadora, de produção de doença, do capitalismo da abundância, do valor mercadológico acima do valor da saúde pública", critica Ivana. "Sem mobilização social esse discurso vai para lugar nenhum, não chega ao Congresso, ao Estado, à mídia".

 

Essas recomendações foram descritas pelas pesquisadoras Inesita Araújo e Janine Cardoso no livro Comunicação e saúde (Ed. Fiocruz, 2007). Falta aos sanitaristas o fortalecimento de sua posição no mercado simbólico que rege a comunicação, um modelo nos moldes do próprio mercado que permita a exposição de sua visão de mundo. Do jeito que está, na discussão sobre liberdade de expressão comercial ganha espaço apenas a visão da indústria — apoiada no mercado e na mídia. Agências reguladoras e sociedade civil, com suas posições em prol do bem-estar coletivo, não têm "apelo comunicativo". A tarefa urgente é apropriar-se das armas do inimigo e fazer valer sua visão.

 

 


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