Publicado em: 09/10/2008
Cientista australiano aponta a deficiência de vitamina D na gestação como fator de risco de esquizofrenia
IARA BIDERMAN
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Nos últimos sete anos, o biólogo Darryl Eyles, diretor do laboratório de neurobiologia do Centro de Estudos em Saúde Mental de Queensland (Austrália), coordenou uma pesquisa sobre o impacto da deficiência de vitamina D na gestação no desenvolvimento da esquizofrenia -distúrbio caracterizado por sintomas como alucinações, cujas causas ainda são pouco compreendidas pela ciência.
Os resultados da pesquisa foram apresentados no seminário "Origens Desenvolvimentistas da Saúde e da Doença", realizado no Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da USP (Universidade de São Paulo), nos dias 25 e 26 de setembro, em São Paulo. Na ocasião, Eyles deu a seguinte entrevista à Folha.
FOLHA - Por que a associação entre vitamina D e esquizofrenia?
DARRYL EYLES - A hipótese surgiu com um dado dos estudos epidemiológicos. A maioria dos pacientes com esquizofrenia nasceu nos meses de primavera e inverno, quando diminuem os níveis de vitamina D no organismo da mãe.
FOLHA - Como foi feita a pesquisa?
EYLES - Foi um estudo em animais, para ver se os que nasceram de mães com deficiência de vitamina D tinham alterações na morfologia do cérebro relacionadas à esquizofrenia. Quando não houve privação da vitamina, ou quando ela ocorreu só no primeiro trimestre da gestação, não se observou sinais do distúrbio, mas a deficiência no final da gestação provocou alterações no cérebro. Os resultados foram iguais em testes comportamentais.
FOLHA - A pesquisa limitou-se aos animais?
EYLES - Partimos de dados populacionais, mas os testes foram feitos em animais. Há uma parte da pesquisa, ainda em andamento, com humanos. Na Dinamarca, estamos recolhendo amostras de sangue de recém-nascidos, e pretendemos acompanhar o aparecimento de distúrbios na vida adulta.
FOLHA - Se a hipótese for confirmada, o que pode ser feito?
EYLES - Para saber se uma intervenção com vitamina D durante a gestação pode prevenir eventos futuros, precisamos de grandes estudos, que ainda não foram feitos. Mas acho que pode ser uma saída. Há um trabalho no Canadá sustentando que a suplementação na gestação pode prevenir defeitos no feto.
FOLHA - Como seria feita essa suplementação?
EYLES - Em termos de desenvolvimento neurológico do feto, deveria ser feita a partir do segundo trimestre da gravidez.
FOLHA - É possível suplementar o bebê após o nascimento?
EYLES - Suplementar a mãe é o modelo. Mas creio que há uma "janela" entre o terceiro trimestre da gestação e o primeiro ano de vida que, arrisco dizer, pode ser usada para prevenir problemas neurológicos.
FOLHA - Em países tropicais, a exposição ao sol garante os níveis de vitamina D?
EYLES - Fizemos uma pesquisa epidemiológica na Austrália, incluindo regiões de clima tropical e de clima temperado. Observamos que em ambas ocorre deficiência de vitamina D no inverno. Há vários fatores que influem na exposição ao sol, como os hábitos urbanos e o uso de bloqueadores solares.