Quando a dor é das mulheres

Publicado em:  13/11/2008

Mulheres sofrem mais de depressão do que os homens. As flutuações hormonais que ocorrem durante o ciclo reprodutivo são uma das principais responsáveis pelo desenvolvimento da doença

A depressão é considerada o mal do século. De acordo com as estatísticas, cerca de 10% da população mundial, em algum período da vida, já apresentou a doença. E as mulheres são as maiores vítimas do problema. De acordo com pesquisa do The National Comorbidity Survey, dos Estados Unidos, elas têm o dobro de chance de manifestar a depressão do que os homens (na faixa etária entre 15 e 54 anos, a prevalência é de 21,3% para elas contra 12,7%, para eles). Dados do Pró-Mulher – Programa de Atenção à Saúde Mental da Mulher, do Instituto de Psiquiatria do Hospital de Clínicas de São Paulo – revelam que 15% das brasileiras sofrem com o distúrbio.

Existem vários fatores que explicam estes números. Em primeiro lugar, é preciso lembrar das múltiplas tarefas que as mulheres exercem hoje: elas tem de ser esposas, profissionais e mães exemplares, muitas ainda são chefes de família e precisam lidar com a discriminação e a falta de oportunidades.

Desde a infância, as mulheres apresentam diferentes recursos para enfrentar situações de estresse. Costumam ser mais sensíveis ao sofrimento alheio e, por isso, estão mais expostas aos gatilhos desencadeantes da depressão.

O sexo feminino também é mais suscetível a dores físicas (muitas vezes sintomáticas) e doenças – como a síndrome do cólo irritável e a fibromialgia – que têm como comorbidades a depressão e a ansiedade. Além disso, existem doenças que pioram durante o período menstrual, como a asma, a epilepsia e as alergias, sem falar nos sintomas da TPM e da menopausa, que trazem angústia e mal-estar.

A flutuação dos hormônios femininos é um dos fatores que mais influencia a incidência da depressão em mulheres, de acordo com um estudo apresentado pelo médico Cláudio Novaes Soares, professor de Psiquiatria e Neurociências do Comportamento na Universidade McMaster, no Canadá, durante o 26º Congresso Brasileiro de Psiquiatria, realizado no mês passado em Brasília.

Ele explica que, ao longo de todo o ciclo reprodutivo da mulher – que começa em média aos 15 anos e se estende até os 65 – , existem as chamadas "janelas de vulnerabilidade", períodos críticos que podem ser um gatilho para crises depressivas e de ansiedade: a fase pré-menstrual, a da gravidez e do pós-parto e a da perimenopausa.

A alta sensibilidade que algumas mulheres apresentam às intensas flutuações hormonais que ocorrem nessas fases pode explicar a predisposição à depressão. Isso ocorre porque os hormônios estrógeno e progesterona dividem as mesmas vias que os neurotransmissores e afetam regiões cerebrais envolvidas na modulação do humor e do comportamento.

 

Janela de maior risco

Mulheres na fase inicial do climatério fazem parte de um grupo ainda mais suscetível ao desenvolvimento de doenças psiquiátricas. Quem está na perimenopausa está quatro vezes mais propensa a experimentar sintomas depressivos relevantes e têm 2,5 vezes mais chances de ser diagnosticada com depressão maior, mesmo as que nunca tiveram histórico da doença.

"Enquanto a fase pré-menstrual dura de cinco a dez dias, a fase da perimenopausa dura em média cinco anos. É um período longo, em que os níveis de estrogênio e progesterona flutuam de forma caótica. Quando essas alterações hormonais causam sintomas vasomotores graves, como os fogachos, podem contribuir para exacerbar a manifestação dos transtornos psiquiátricos. Essa relação ocorre porque o estrogênio, além de ter função reguladora do humor e do comportamento, também age como regulador da temperatura", explica o especialista.

Intervenção hormonal

Ao mesmo tempo em que o psiquiatra identifica fases do período menstrual como janelas de vulnerabilidade, ele também as encara como "janelas de oportunidade", já que facilitam o diagnóstico e o tratamento da depressão. "Já constatamos que não há como tratar a depressão feminina e a masculina da mesma maneira. Os tratamentos de intervenção hormonal, que promovem o equilíbrio dos níveis de progesterona e estrógeno, podem contribuir e muito para tratar dos transtornos depressivos e de ansiedade nas mulheres", explica o médico.

Em seu estudo, Cláudio Soares observou que, mesmo em mulheres que tomam antidepressivos, os sintomas da doença se agravam durante a TPM. Mas as pacientes que tomaram contraceptivos orais contínuos durante um período de dois meses deixaram de ter crises de exacerbação pré-menstrual.

A reposição hormonal também é uma alternativa eficiente para as mulheres que estão se aproximando do climatério. "Mas existe um tempo para usar e outro para parar. Quanto mais cedo a paciente inicia o tratamento, mais protegida ela estará de problemas cardiovasculares, neurológicos e até mesmo cognitivos. Quem inicia a reposição hormonal após a menopausa não se beneficiará do tratamento, pelo contrário", alerta.


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