Tanorexia: a mania dos bronzeados

Publicado em:  12/01/2009

A medicina não classifica o comportamento como doença, mas é fácil achar gente obcecada por passar o ano todo com a pele dourada

A pele branca foi sinônimo de nobreza no passado. Já não é mais. Faz algumas décadas que o padrão de beleza se baseia em corpos bronzeados. É por isso que a tecnologia tem desenvolvido técnicas cada vez mais elaboradas para satisfazer esse desejo. No campo comportamental, a obsessão pelo bronzeado permanente – por recurso natural ou por meio artificial – ganhou até um termo próprio: tanorexia.

Coordenador da Sociedade Brasileira de Psiquiatria, José T. Thomé explica que o termo tanorexia surgiu no último verão entre a população da Inglaterra e foi divulgado pela mídia daquele mesmo país, chegando recentemente ao Brasil." O termo é interpretado como a compulsão por se manter bronzeado. Por ser parecido com palavras como anorexia, que exprime uma doença de verdade, o termo se espalhou rapidamente. A tanorexia, porém, não existe. E o ato de se bronzear não causa dependência de forma alguma", garante Thomé, ressaltando que já discutiu o assunto com diversos psicólogos, dermatologistas, cirurgiões plásticos e outros especialistas em estética. De acordo com ele, os profissionais teriam concluído que a tanorexia é apenas uma "nova palavra da moda."

A ciência já comprovou que raios solares poderiam inibir alguns quadros depressivos, mas esse efeito, na opinião de Thomé, não seria capaz de provocar dependências. "Se o culto ao corpo valoriza o bronzeado, a pessoa insegura vai fazer de tudo para se enquadrar nesse padrão. E o mesmo se dá como outras ações que garantem status, como a busca pelo cabelo liso, o corpo malhado e a roupa da moda", argumenta.

A palavra tanorexia pode até ser uma invenção, mas a conotação de 'vício' que os próprios bronzeados vinculam ao termo é surpreendente.

Na web existem pelo menos duas comunidades virtuais formadas por pessoas que se consideram tanoréxicas. É o caso da produtora de moda Marilia Barros, 28 anos, apelidada pelos amigos de 'fotossíntese.' Carioca, ela reserva duas horas, em três dias da semana, para o bronzeamento. Para reforçar a cor, come cenoura e beterraba. Ela diz nunca ter pensado na tanorexia como doença ou distúrbio, mas confessa que abster-se do sol por causa de algum compromisso é algo que a deixa mal-humorada. "Comecei a pegar sol constantemente há alguns anos, entre os intervalos da faculdade. Tinha dias em que eu nem voltava para assistir ao restante das aulas. É viciante", confirma. Ela lembra que quando leu sobre os sinais da tanorexia descobriu que apresentava todos eles."Eu me senti totalmente tanoréxica", garante.

No inverno, Marília se torna o centro das atenções por conta da pele dourada. "Já passei bronzeador até no rosto. Certa vez fui à praia após uma sessão longa no cabeleireiro. Não resisti. Coloquei o biquíni e tomei cuidado com a escova. Também experimentei, uma única vez, a câmara artificial. Foi no auge da febre desse recurso. A sensação é terrível. Gosto mesmo é do sol natural", diz. Marilia admite que nem sequer usa protetor solar, comportamento condenado pelos dermatologistas. "Só aplico no rosto, para evitar futuras rugas", conta.

A personal trainer Grazielly de Oliveira Lacerda, 24 anos, é outra vaidosa que não abre mão de pegar sol. Ela, que atualmente mora em São Paulo, revela que também se destaca entre as amigas durante o inverno. Como tem piscina em casa, se bronzeia até mesmo entre os intervalos do trabalho. E quando o tempo está nublado ou frio, os cremes autobronzeadores entram em cena. "Já deixei de me divertir, como ir ao shopping e até ao salão de beleza, para pegar sol. Faço questão de estar sempre morena", afirma. A garota jura que não é uma dependente do bronzeado, mas confessa que a pele dourada faz bem para sua autoestima. "Se precisasse ficar sem me bronzear por um mês não teria meu comportamento afetado, mas com certeza não me sentiria tão bonita em frente ao espelho. Ficaria meio apagada."

Grazielly, ao contrário de Marília, aprendeu que usar protetor solar é essencial para um bronzeado bonito. "Há um ano incluí o protetor na rotina. Sei dos perigos do câncer de pele, mas tenho medo principalmente das manchas. Como tomo muito sol, estou me protegendo bastante", afirma.

A ciência nega que bronzear-se possa causar dependência. De acordo com a Sociedade Brasileira de Dermatologia a tanorexia não deve, portanto, ser classificada como um distúrbio psicológico. O fator mais preocupante que envolve a questão, segundo os médicos, é a possibilidade de que a mania do corpo dourado provoque um aumento das doenças de pele relacionadas ao excesso de sol sem proteção.

"Cientificamente o termo tanorexia não é conhecido pelos médicos", esclarece a dermatologista Selma Cernea, uma das coordenadoras da Campanha Nacional Contra o Câncer de Pele. A medica revela, contudo, que já tratou pessoas que sentiam incômodo quando a pele estava ao natural."No consultório, pacientes já comentaram que se não estivessem com a cor dourada ficavam com baixa autoestima. O sol em excesso, independentemente da frequência, é sempre perigoso", alerta.

 


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