Publicado em: 12/01/2009
"Hoje em dia banaliza-se muito a depressão. Deprimir é quase uma moda", afirma, em exclusivo a este jornal, Isabel Neves, neuropsicóloga, que considera que, nos dias de hoje, é notória a confusão entre "estar deprimido" e estar, efetivamente, com uma depressão. "Existem vários fatores que, naturalmente, deprimem a pessoa, mas não é um estado depressivo, apesar de muitas vezes ser assim conotado."
De acordo com Isabel Neves, "nos Açores as depressões têm aumentado bastante nos últimos anos". Aliás, e apesar da falta de estudos na Região, a neuropsicóloga considera que o índice de depressão "é bastante elevado. Acho que mais elevado do que em Portugal continental, apesar deste ter mais população". Para Isabel Neves, esta maior incidência no Arquipélago é facilmente explicável. "As ilhas têm um índice bastante elevado por estarem rodeadas de mar, o que poderá deprimir facilmente pela dificuldade em sair". Também o clima é uma causa, "por conduzir muitas vezes a constantes mudanças de humor". A neuropsicóloga defende um maior investimento no estudo da depressão na Região, pois "não nos podemos basear apenas nos dados enviados à Direção Regional de Saúde".
É, contudo, necessário distinguir os vários tipos de depressão. Isabel Neves começa por explicar que "uma depressão é quando a pessoa tem vulnerabilidade própria para tal, ou quando uma pessoa que tem tudo sente necessidade de estar depressiva". Este tipo de depressão é a chamada 'major', que já se enquadra nas patologias e que é considerada mais grave "por ter uma certa cronicidade, portanto, nunca é completamente tratada". Dentro desta classificação enquadram-se ainda as depressões endógenas, ou seja, intrínsecas ao indivíduo. "Nestes casos as pessoas já nascem com vulnerabilidade para a depressão, sendo que começam a demonstrar alguns sintomas desde a adolescência", explica a neuropsicóloga, que considera ser este o grupo de maior risco, com depressão crônica, em que é realmente necessária medicação.
Contudo, "apesar do efeito atenuante da medicação, a pessoa nunca é curada por completo". As depressões reativas, que são as mais comuns, não são mais do que "uma reação a uma situação adversa no meio ambiente", algo por que a maior parte das pessoas passam, com maior ou menor intensidade. "As depressões reativas manifestam-se quando uma pessoa se encontra numa situação econômica frágil, por estar desempregado. Ou seja, se esta pessoa arranjar um emprego, a situação econômica estabiliza e a depressão passa". Outro caso de depressão reativa é o falecimento de alguém próximo. Contudo, se persistir por mais de um ano, esta poderá tornar-se major e, como tal, crônica. Isto é mais provável de acontecer "quando as pessoas acumulam três ou quatro situações. Se não tiverem apoio, podem conduzir a situações extremas".
As estatísticas apontam para uma maior incidência da depressão nas mulheres. Contudo, para Isabel Neves isto "não está bem estudado em Portugal". Como tal, opta por desmistificar estes dados. "As estatísticas apontam neste sentido, mas é porque as mulheres recorrem mais aos médicos do que os homens. A depressão é muito vista como a doença da mulher. O homem leva muito mais tempo a assumir que poderá estar doente e a procurar ajuda", conclui.
A reabilitação não passa só pela medicação
Existem, de fato, depressões em que a medicação é essencial, sobretudo se se tratar de uma depressão crónica, afirma Isabel Neves. No caso de uma depressão reativa, uma intervenção e acompanhamento psicológico durante cerca de seis meses é eficaz para o tratamento. "Muitas vezes as pessoas não sabem lidar com o meio ambiente e necessitam de aconselhamento. A medicação não cura, apenas atenua". E o recurso a medicamentos deverá ser igualmente temporário, pois "a partir de uma certa altura, a medicação transtorna o indivíduo, condicionando o organismo para a depressão".