Consumo moderado de álcool pode não trazer benefícios à saúde

Publicado em:  29/06/2009

A ladainha já é conhecida. Estudo após estudo sugere que, consumido com moderação, o álcool pode favorecer a saúde cardíaca e até mesmo prevenir o diabetes e a demência. As evidências são tão fartas que alguns especialistas veem o consumo moderado de álcool - cerca de um drinque por dia, no caso das mulheres, e dois, no dos homens - como componente central de um estilo de vida saudável. Mas, e se for tudo um equívoco?

Para alguns cientistas, essa é uma pergunta que não quer calar. Nenhum estudo, dizem esses críticos, jamais comprovou uma relação causal entre consumo moderado de álcool e menor risco de morte. Os estudos apenas indicam que as duas coisas andam de mãos dadas. É possível que beber com moderação seja algo que as pessoas saudáveis tendem a fazer, e não algo que torne as pessoas saudáveis.

"Os bebedores moderados tendem a fazer tudo certo: eles se exercitam, não fumam, c omem corretamente e bebem com moderação", disse Kaye Middleton Fillmore, socióloga da Universidade da Califórnia, em San Francisco. "É muito difícil desemaranhar tudo isso."

Alguns pesquisadores se dizem assombrados pelos erros cometidos nas pesquisas sobre terapia de reposição hormonal, que durante anos foi amplamente prescrita com base em estudos de observação, como os do álcool. Perguntas também vêm sendo formuladas sobre as relações financeiras entre a indústria das bebidas alcoólicas e muitas universidades, que aceitaram dinheiro para financiar pesquisas. "O fato é que não há nenhum estudo sobre o consumo moderado de álcool e resultados em termos de mortalidade - o tipo de teste clínico aleatoriamente controlado que seria exigido para aprovarmos um novo agente farmacêutico nos EUA", disse Tim Naimi, epidemiologista do Centro de Controle de Doenças americano (CDC).

Mesmo os defensores inveterados do consumo moderado de álcool acompanham suas recomendações com avisos sobre os perigos da bebida, que já foi vinculada a cânceres e pode levar a acidentes ainda que consumida em quantidade pequena.

"É muito difícil formular uma mensagem única, porque neste caso um tamanho único não cabe em todos, e a mensagem de saúde pública precisa ser muito conservadora", disse Arthur L. Klatsky, cardiologista de Oakland, Califórnia, e autor, nos anos 1970 de um estudo constatando que os filiados a um plano de saúde que bebiam com moderação apresentavam menos chance de ser hospitalizados por ataques cardíacos do que os abstêmios.

"As pessoas que não conseguem limitar-se a um ou dois drinques por dia não devem beber, e as pessoas que têm doença hepática, tampouco", disse Klatsky. Mas "um homem na casa dos 50 ou 60 anos que tem um ataque cardíaco, decide mudar seus hábitos e abre mão de seu cálice de vinho à noite - essa pessoa se sairia melhor bebendo moderadamente".

Alguns cientistas dizem que já é hora de fazer um teste clínico grande, de longo prazo e aleatoriamente controlado, como os feitos para novos medicamentos. Mas há problemas práticos e éticos em administrar álcool a abstêmios sem que eles tenham consciência disso e sem contribuir para acidentes.

"A última coisa que queremos é expor as pessoas, e esse medo nos tem impedido de fazer um teste", disse Sei Lee, pesquisador da Universidade da Califórnia, em San Francisco, que propôs um grande teste clínico sobre álcool e saúde. "Mas esta é uma questão realmente importante, porque temos aqui uma substância prontamente disponível e largamente consumida que pode de fato trazer um benefício significativo à saúde - mas não sabemos o suficiente para fazer recomendações."


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