Publicado em: 28/08/2009
O psiquiatra Dirceu Zorzetto Filho, membro da Diretoria da Sociedade Paranaense de Psiquiatria, teve sua tese de doutorado sobre depressão aprovada na última semana, dia 21 de agosto. Zorzetto, que já é mestre em Ciências Médicas, agora é doutor pelo Programa de Pós-Graduação em Psiquiatria pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). "É um afago no ego pelo trabalho ter sido considerado relevante e original pelos membros da banca examinadora", afirma o médico, que foi orientado pelo Prof. Miguel Roberto Jorge, professor Associado de Psiquiatria e Pró-Reitor de Graduação da Unifesp. O atual professor assistente do Departamento de Medicina Forense e Psiquiatria da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e professor da Disciplina de Psiquiatria do Curso de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) teve como co-orientador o médico psiquiatra Ricardo Moreno, que é professor do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo.
Com experiência na área de transtornos do humor e ansiedade, Zorzetto elaborou estudo sobre sintomas físicos que fazem parte do quadro clínico da depressão. De acordo com estudos da Organização Mundial de Saúde, a depressão acomete cerca de 10% da população brasileira e estima-se que em 2020 seja segunda maior causa de incapacitação do indivíduo. A pesquisa do psiquiatra paranaense tem uma importância médica ao apontar a alta prevalência de sintomas depressivos (54%) entre pacientes atendidos em uma Unidade de Saúde da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba. Além disso, ele aponta que a apresentação clínica da depressão nessa população ocorre predominantemente por meio de sintomas somáticos.
Leia a seguir o resumo do trabalho apresentado pelo Doutor Dirceu Zorzetto Filho, examinado pela seguinte banca: Marco Antonio Brasil (UFRJ), Roberto Andreatini (UFPR), Wang Yun-Pang (Unifesp) e Sérgio Baseter Andreoli (Unifesp).
SINTOMAS SOMÁTICOS DA DEPRESSÃO
Autor: Dr. Dirceu Zorzetto Filho
Background: O transtorno depressivo maior (TDM) envolve uma variedade de sintomas afetivos, cognitivos, somáticos e comportamentais. Tradicionalmente, as classificações dos estados depressivos têm dado maior ênfase aos sintomas psicológicos e cognitivos da depressão (humor depressivo, a falta de interesse, a culpa excessiva e(ou) inapropriada, os pensamentos suicidas, os sentimentos de desesperança e, a indecisão). Entretanto, as manifestações somáticas são comuns na depressão e em alguns casos, sintomas afetivos e cognitivos podem estar encobertos atrás de uma variedade de queixas físicas (Fava, 2002). O fracasso em reconhecer os sintomas somáticos como parte integrante do transtorno depressivo associa-se a um aumento considerável dos recursos financeiros gastos em saúde pública. Além disso, os sintomas somáticos aumentam a sobrecarga e a incapacitação normalmente associadas à depressão. No Brasil existe uma considerável lacuna de estudos que avaliem a associação entre os transtornos depressivos e sintomas somáticos, bem como suas repercussões em termos epidemiológicos, clínicos e de funcionamento social dos pacientes.
Objetivos do estudo: Esta pesquisa teve por objetivo estimar a proporção dos sintomas somáticos não explicados por uma condição médica geral em uma amostra de pacientes portadores de transtorno depressivo maior (segundo o DSM-IV) entre a população atendida no Programa de Saúde da Família, em uma unidade de saúde da rede de Atenção Primária em Curitiba (PR). Buscou também estabelecer a gravidade atribuída a esses sintomas pelo próprio portador e correlacionar esses sintomas somáticos clinicamente inexplicados (SSCI) com variáveis clínicas (como a gravidade do quadro depressivo, comorbidades, recorrência do transtorno depressivo e resposta a tratamento farmacológico) e sociodemográficas (como sexo, idade, estado civil, escolaridade, nível social e ocupação).
Metodologia: Na primeira fase deste estudo, foram avaliados todos os 201 pacientes, de ambos os sexos, com idade entre 18 e 64 anos, que buscaram atendimento ambulatorial no período da manhã, na US PSF Vila Leonice, no bairro Cachoeira, em Curitiba (PR). Esses pacientes responderam à Escala de Depressão do Centro de Estudos Epidemiológicos (CES-D) e ao Questionário sobre a Saúde do Paciente – Sintomas Somáticos (PHQ-15). e de Saúde. Os participantes que alcançaram pontuação igual ou superior a 15 na CES-D (114 participantes) foram considerados "suspeitos" de apresentar um quadro depressivo foram entrevistados com a SCID-I/P, com o objetivo de identificar a presença ou não de transtorno psiquiátrico, formular o principal diagnóstico psiquiátrico e suas comorbidades clínicas. Além dessas informações, perguntou-se aos pacientes sobre o número de tentativas de suicídio, hospitalizações psiquiátricas, clínicas e cirúrgicas prévias no decorrer de sua vida. Para avaliar se os sintomas somáticos referidos pelos sujeitos poderiam ser devidos a uma condição médica subjacente, construiu-se uma ficha clínica com a lista de sintomas somáticos do PHQ-15 que o sujeito apresentava, a história clínica resumida, dados do exame físico e laboratoriais. Cada uma das fichas clínicas foi avaliada por um único médico com especialização em clínica médica, que classificou cada um dos sintomas somáticos de acordo com os seguintes critérios: (1) não explicado pelo diagnóstico clínico; (2) pouco explicado pelo diagnóstico clínico; (3) bastante explicado pelo diagnóstico clínico e (4) totalmente explicado pelo diagnóstico clínico.
Resultados: Todos os 69 pacientes com transtorno depressivo (episódio único ou recorrente), que constituíam a amostra pesquisada, apresentaram sintomas de natureza somática que não eram devidos a uma condição médica. Em média, cada paciente com transtorno depressivo apresentava oito sintomas somáticos sem explicação ou pouco explicados clinicamente, uma taxa significativamente maior do que a apresentada pelo grupo de sujeitos sem suspeita de depressão (1,3 sintomas inexplicados clinicamente/sujeito). Os pacientes deprimidos consideraram que seus sintomas somáticos interferiam significativamente com o seu bem-estar ("incomodam bastante") e 82,6% deles atribuíram a esses sintomas um nível de gravidade entre moderada a alta. Entre as mulheres, esses sintomas somáticos eram mais frequentes e mais graves do que na população masculina do estudo. Os resultados demonstraram a existência de uma associação forte entre a gravidade atribuída aos sintomas somáticos e a gravidade do quadro depressivo (quanto maior a gravidade do quadro depressivo, maior a gravidade dos sintomas somáticos). Confirmando achados consagrados na literatura médica, os pacientes deprimidos desta amostra foram considerados como "superutilizadores" dos serviços de saúde, tendo sido atendidos pelos profissionais de saúde da Unidade de Saúde Vila Leonice numa quantidade de vezes significativamente maior do que os sujeitos sem suspeita de depressão. Durante o ano de 2007, cada paciente com depressão foi atendido 12,55 vezes por profissionais da área de saúde, enquanto no grupo SSD registraram-se 8,16 atendimentos/ano.