AmBev poupou milhões, dizem especialistas

Publicado em:  15/11/2009

A AmBev é a empresa que detém a carteira com a maior quantidade de marcas mais caras. Logo, para ela, a "pauta fiscal" é mais vantajosa.

 

No dia 30 de janeiro de 2004, os bancos Credit Suisse First Boston e Morgan Stanley divulgaram relatórios sobre o impacto para a AmBev provocado por uma medida provisória e instruções normativas publicadas numa edição extra do "Diário Oficial da União" na noite anterior.

Os dois bancos afirmaram que as medidas tributárias, com mudanças no recolhimento de PIS e Cofins sobre cervejas e refrigerantes, foram claramente favoráveis à AmBev em detrimento dos concorrentes.

O caso foi revelado na época pelo então colunista da Folha Luís Nassif.

A consultoria BDO Trevisan, num amplo estudo sobre o assunto obtido agora pela reportagem, calculou que a AmBev teria uma economia de R$ 147 milhões nos dois tributos somente em suas três principais marcas de cerveja (Skol, Brahma e Antarctica), consideradas as regras introduzidas no dia 29 de janeiro de 2004.

Exatamente um mês antes, no dia 29 de dezembro de 2003, entrou em vigor a lei 10.933, pela qual foi criada a possibilidade de duas formas de cobrança de PIS e Cofins sobre cervejas.

O fabricante poderia optar por alíquota de 8% sobre o faturamento ou por um valor fixo do tributo, expresso em reais. Essa segunda opção é chamada de "pauta fiscal".

A "pauta fiscal" sai proporcionalmente mais cara para os produtos mais baratos. Suponha-se que a caixa de uma cerveja custe R$ 5, e a de uma outra, R$ 10, e que o PIS e a Cofins somados sejam de R$ 0,5. Para a primeira marca, o imposto custa 10% do valor da mercadoria. Para a segunda, 5%. Ou seja, a cerveja mais barata paga o dobro do tributo.

A AmBev é a empresa que detém a carteira com a maior quantidade de marcas mais caras. Logo, para ela, a "pauta fiscal" é mais vantajosa.

Na época, o colunista da Folha escreveu que a Schincariol, se optasse pela pauta fiscal, pagaria R$ 2,97 por caixa de cerveja. Pela alíquota de 8%, o valor cairia para R$ 1,04.

No dia 29 de janeiro de 2004 à noite, saiu a edição extra do "DO", com novas regras tributárias que elevaram de 8% para 14,5% a alíquota para a venda de bebidas. Na mesma edição extra, foi publicado o decreto 4.965, que introduziu uma redução de 45% no valor da "pauta fiscal". O quadro foi invertido completamente. Pela "pauta fiscal", o valor do imposto sobre cada caixa de cerveja caiu de R$ 2,97 para R$ 1,63. Já pelo critério da alíquota, subiu de R$ 1,04 para R$ 1,87.

"As mudanças foram muito mais favoráveis para a AmBev do que poderíamos supor", diz relatório do Morgan Stanley.

"A sujeição à tributação ["pauta fiscal'] poderá ser maior para alguns concorrentes, consequentemente esses competidores da AmBev ajustarão seus preços para a cima", diz relatório do Credit Suisse.

Saiba mais

Receita apurou suposta "venda de legislação"

Em 2003, a Corregedoria-Geral da Receita iniciou investigação para apurar suposta "venda de legislação" no fisco na gestão de Everardo Maciel (1995 a 2002).

Os dois principais alvos da corregedoria eram assessores diretos e homens de confiança de Everardo, Sandro Martins e Paulo Baltazar Carneiro. Martins também foi assessor especial do sucessor de Everardo, o ex-secretário Jorge Rachid.

Os dois mantinham uma consultoria tributária, chamada Martins Carneiro. Eram conhecidos como "anfíbios" -ora trabalhavam na Receita, ora na iniciativa privada, contra o fisco.

Pelo menos quatro grandes empresas foram beneficiadas pela atuação da dupla: a construtora OAS, a Eximbiz Comércio Internacional, a Fiat e o McDonald's.

A Martins Carneiro recebia os pagamentos sempre após a Receita editar normas tributárias benéficas para os clientes da consultoria.

No ano passado, o ministro Guido Mantega (Fazenda) demitiu Martins e converteu a exoneração de Carneiro, então aposentado, em destituição (não poderá mais atuar no serviço público).

O ministro entendeu que os servidores enriqueceram ilegalmente utilizando informações privilegiadas e estratégicas de seus cargos contra a própria Fazenda Nacional.

Poucos meses após a demissão dos dois servidores, o ministro decidiu exonerar Rachid da Receita.

 


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