Publicado em: 11/12/2009
XICO SÁ
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Marcelo Rossi foi um álibi apostólico romano para dar um lastro de santidade a uma transação econômica
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AMIGO TORCEDOR , amigo secador, mantendo a tradição de abadias e mosteiros, quem fermentam os melhores líquidos do mundo, eis que a cerveja pode voltar aos estádios de SP com a ajuda de um padre. Sim, um vigário, celebridade, o reverendo Marcelo Rossi.
Nada contra as loiras ou pretas que nos refrescam nos trópicos delirantes. Estava difícil mesmo ver embates tão ruins a seco. Tenho muitos amigos que deixaram de ir aos campos por causa de tais proibições.
Há controvérsia sobre a eficiência do veto. Óbvio. Em terras paulistas, o couro ainda come dentro e fora das arquibancadas, sem falar em outras explosões de fúria, como na civilizadíssima Curitiba. Na Europa, grandes ligas também são patrocinadas pela mesma bebida, quer dizer, com certa diferença na qualidade, digamos, técnica e cristã -aprenderam com os monges mais antigos.
Enfim, nada contra a volta da breja, como é vista na prosódia do Brás, Bixiga, Barra Funda e derredores.
Para completar, sou do tempo em que, além de ser liberada a espuma flutuante, a gente ia para Romeirão, Arruda, Ilha, Aflitos, Mané Garrincha, Maraca, Moça Bonita, Pacaembu e Morumbi -citando templos das cidades onde morei- pagando a cerveja de torcedores adversários. Como a festa que os visitantes ainda têm direito hoje na várzea.
Na boa, tudo certo, mas posso tirar onda antes de eventuais polêmicas?
O genial da história, além da criação do publicitário que pensou a estratégia, é ter um religioso no episódio.
Um álibi apostólico romano, em nome da paz, para dar lastro de santidade a uma tenebrosa transação econômica. Que tacada, amigo Paulo César Campos Viejo, vulgo Peréio.
Pensa que é obra de Zé Mané? Só o nosso glorioso Reich, o maníaco de todos os parques, explica.
Se é o bispo Macedo, nada católico, ou qualquer outro neopentecostal do mesmo ramo, o perdão seria muito mais difícil, não acha?
Sim, ninguém é santo, talvez só a cerva mereça o reino dos céus, mas, amigo, o argumento alcoólico do padre Marcelo, que li ontem nesta Folha, é mais genial: "As bebidas fermentadas são toleradas pela igreja.
O problema está nos destilados".
Coitados dos russos, dos escoceses, dos irlandeses e do bom povo de Salinas e região, Minas Gerais: arderão no fogo dos infernos?
É, velho e forte Bortolotto, homem de fé como poucos, como diz o título de uma das suas peças, pergunto: o que restou do sagrado? Este cronista, como aprendeu com o groucho-marxismo, sabe que todos têm que acreditar em algo: eu creio que agora vou tomar um uísque!
Ato de fé
Por falar no amigo, baleado por assaltantes ao lado de outro artista, o Carcará, deixo uma convocatória: grupo de quadrinistas promove hoje, às 19h, manifesto pela melhora de Mário Bortolotto e pela paz na praça Roosevelt, SP. Laerte, Grampá, Gabriel Bá, Angeli, Caco Galhardo, Mutarelli, Rafael Coutinho, Fábio Moon, Guazzelli, Fábio Cobiaco, André Kitagawa, Marcelo Campos, entre outros, pintarão, na hora, dois grandes painéis. As obras, que já nascem primas, serão rifadas. O dinheiro é para ajudar nas despesas do tratamento e de recuperação do dramaturgo.