Publicado em: 08/01/2010
Pesquisadores suecos que
acompanharam homens de meia-idade durante 30 anos questionam a existência de
"gordinhos saudáveis"
O excesso de peso em pessoas
aparentemente saudáveis -com níveis satisfatórios de colesterol, triglicérides,
glicemia e pressão arterial- é um fator independente de risco para doenças
cardiovasculares, segundo um estudo da Universidade de Uppsala, na Suécia,
publicado no periódico "Circulation". A conclusão contraria o
conceito de que há um subgrupo de "gordinhos saudáveis".
O estudo, que acompanhou mais de
1.700 homens de meia-idade por 30 anos, é o mais longo trabalho sobre a relação
entre obesidade e risco de doenças do coração já realizado.
Até então, os dados mostravam que
pessoas com sobrepeso ou obesas que não apresentavam síndrome metabólica não
tinham risco cardiovascular maior. Na pesquisa, a síndrome foi definida pela
presença de ao menos três de cinco fatores: hipertensão arterial, intolerância
à glicose, colesterol alto, colesterol HDL ("bom") baixo e
circunferência abdominal acima dos limites normais.
"Classicamente, imaginava-se
que o excesso de peso por si só não aumentava diretamente o risco
cardiovascular. O novo estudo coloca esse conceito em dúvida", diz Raul
Dias dos Santos, diretor da Unidade Clínica de Dislipidemias do InCor
(Instituto do Coração).
Uma das hipóteses para explicar a
relação direta entre o excesso de peso e as doenças cardiovasculares é a
atividade pró-inflamatória do tecido gorduroso. "As gorduras liberam
substâncias que, no fígado, são transformadas em agentes inflamatórios e vão
para a corrente sanguínea, podendo agredir os vasos do coração e do cérebro.
Também liberam substâncias que, nos músculos, bloqueiam a ação da insulina,
favorecendo o diabetes", diz Santos.
Para Daniel Magnoni, chefe do
serviço de nutrologia do HCor (Hospital do Coração), "não dá para falar em
"gordinho saudável", já que o excesso de peso predispõe ao
desenvolvimento de diversas outras doenças, não apenas as do coração".
Em relação ao aumento do risco
cardiovascular, Magnoni aponta que, além do IMC (índice de massa corpórea)
utilizado no estudo para caracterizar sobrepeso e obesidade, seria preciso
avaliar fatores como a prática de atividade física, o consumo regular de frutas
e verduras e o nível de estresse, que não foram considerados no estudo. No
entanto, os pesquisadores suecos fizeram os ajustes para idade, hábito de fumar
e níveis de colesterol LDL ("ruim").
Mesmo ajustando esses fatores,
foi observado que homens com sobrepeso sem síndrome metabólica têm um risco 52%
maior de sofrer infarto, derrame ou insuficiência cardíaca. Nos obesos sem a
síndrome, o risco foi 95% maior. Os dados ressaltam a importância de tratar o
sobrepeso independentemente da existência de outros fatores de risco, mas não
minimizam a importância da síndrome metabólica: a pesquisa também mostrou que,
com a síndrome, o risco aumenta para 74% nos homens com sobrepeso e para 155%
nos obesos.
Heno Lopes, coordenador do
Ambulatório de Síndrome Metabólica do InCor, não se surpreende com esses
resultados. "A obesidade tem relação direta com o aumento da pressão
arterial, dos triglicérides e a resistência à insulina, por isso o risco do
ganho de peso sempre foi valorizado", afirma.
O fato de existirem obesos que não desenvolvem doenças cardiovasculares não minimiza o risco para a população em geral. "Por alguma razão que ainda desconhecemos, há indivíduos com algum fator cardioprotetor, mas esses são a exceção, não a regra", diz Lopes.