Prisão do narcotraficante "La Barbie" dá fôlego ao governo de Calderón

Publicado em:  01/09/2010

"La Barbie" foi preso pela polícia federal mexicana em uma área residencial da Cidade do México

 

Há golpes providenciais. Quando se está a 48 horas de apresentar seu quarto relatório anual de governo, e somente no mês que corre assassinaram dois prefeitos, explodiram três carros-bombas, sequestraram três jornalistas, mataram 72 imigrantes e se rebelaram policiais de elite em Ciudad Juárez, informar sobre a detenção do narcotraficante mais midiático no penúltimo dia deste fatídico agosto é um alívio se você se chama Felipe Calderón e é presidente do México.

 

Na noite de segunda-feira, pouco depois das 19 horas, as novelas de televisão foram interrompidas por um alerta informativo de três palavras que todos entenderam: "Caiu La Barbie". Foi detido pela polícia federal a poucos quilômetros da capital, onde há semanas o haviam cercado. Dizem que seu apelido vem de quando jogava futebol americano, totalmente gringo. Outros acreditam que se deve a seus olhos azuis e pele clara. O caso é que ninguém precisava imaginar como é. Ao contrário do que acontece com outros fugitivos, dele se conheciam fotos muito descritivas. Nada de uma imagem borrada e de perfil pouco revelador. Não. Em uma delas, Edgard Valdez Villarreal olha para a lente. Em uma das mãos, um cuba-libre e relógio dourado. Na outra, o quadril de uma loura. A imagem de La Barbie detido, cabelo rapado e olhar retorcido, que circula uma hora mais tarde nesta segunda-feira, não destoa: é ele.

 

É o mesmo que nasceu em Laredo, Texas (EUA), em 11 de agosto de 1973. O que foi detido em 1994 no Missouri. É o que ganhou a confiança de Joaquín Guzmán Loera, aliás El Chapo, e Ismael Zambada, aliás El Mayo, líderes máximos do Cartel de Sinaloa. O que enfrentou o Cartel do Golfo e os Zetas em Tamaulipas e que ao fazê-lo inclusive inaugurou uma modalidade: gravou o interrogatório e a execução de quatro zetas. O que ganhou a confiança de Arturo Beltrán Leyva, o "chefe dos chefes", que o fez seu líder de bandidos. O mesmo que não conseguiu resgatar seu patrão em dezembro passado, em Cuernavaca, Morelos (centro do país), quando a Marinha Armada do México o encurralou e matou em um condomínio de luxo.

 

Segundo afirmou a polícia na terça-feira, ele sugeriu a Beltrán Leyva que não resistisse ao ataque e se entregasse. Ele, que é acusado de traição pelos irmãos do "chefe dos chefes", protagonizava um cruel combate com Héctor Beltrán Leyva, aliás El H, pelo controle do que restava desse cartel, transformando Guerrero, com sua predileta cidade de Acapulco, e Cuernavaca em campo de batalha onde neste ano apareciam até 20 corpos por mês com "narcomensagens" jurando extermínio mútuo. La Barbie.

 

O governo mexicano o acusa de distribuir e vender droga. De ter contatos criminosos com organizações das Américas Central e do Sul e de dedicar-se a levar entorpecentes para os EUA. De lavar dinheiro, extorquir, roubar veículos. Havia recompensas em território mexicano e americano. Trabalhos de inteligência que já duravam mais de um ano haviam levado a invadir apartamentos em bairros luxuosos da Cidade do México e arredores. Com a informação obtida em cada ação, a sorte ficou lançada ao meio-dia de segunda-feira, quando um de seus colaboradores tentou fugir ao sul da capital, diante do shopping center mais tradicional. Ficaria morto um contador que, segundo as autoridades, fazia parte da rede de Valdez Villarreal, que quatro horas depois seria detido em Lerma, Estado do México, junto com outras seis pessoas.

 

Além da limpeza do operativo em que não se detonou um tiro, apesar de os detidos possuírem entre outras armas um lança-granadas, destacou-se que dos outros detidos cinco são do Distrito Federal, demolindo o mito de que o narco é de outras latitudes, que a capital mexicana é imune. Valdez Villarreal tem mandados de prisão em Nova Orleans e Atlanta (EUA). No México também. Mas seu destino ainda não é claro. A promotoria o denunciou ontem, mas poderia ser extraditado para os EUA, como outros acusados de narcotráfico.

 

Cada vez que um chefe do narcotráfico é detido, arrebenta uma disputa entre criminosos pelo lugar vago. Na própria terça-feira houve uma chacina em um bar de strip-tease em Cancún, onde morreram oito pessoas, seis mulheres e dois homens. O procurador de Quintana Roo não duvidou em atribuir o ataque com bombas molotov a uma primeira reação - ocorreu apenas seis horas depois - da queda de La Barbie.

 

Nas últimas semanas o presidente Calderón realizou uma série de consultas com vários setores da sociedade para rever sua estratégia de combate aos cartéis das drogas. Depois de mais de 28 mil mortos, o presidente parecia encurralado. A morte pelas mãos do exército em 29 de julho de Ignacio Nacho Coronel, sócio de Chapo Guzmán, e a detenção de Edgar Valdez Villarreal na segunda-feira, deram ao presidente um balão de oxigênio, um bálsamo contra os questionamentos que o sangue derramado provoca. Para avaliar os prováveis cenários, o presidente se fechou na terça-feira com seu gabinete de segurança. Certamente, como todos os que o viram pela televisão, intrigados pelo sorriso que La Barbie exibiu ao ser apresentado na terça-feira ao amanhecer pela polícia. O que queria dizer esse sorriso.

 


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