Publicado em: 09/09/2010
Firma usava especialistas como "laranjas", assinando estudos que não fizeram, para mostrar eficácia de remédio. Empresa farmacêutica sofre ação judicial nos EUA; indústria diz que não houve má conduta na adoção da prática.
A indústria farmacêutica está novamente no centro de um escândalo. Documentos confidenciais da gigante Wyeth -hoje incorporada à Pfizer- mostram que a companhia sistematicamente plantava artigos favoráveis a seus medicamentos em periódicos científicos.
O caso mais emblemático é o do remédio Prempro, usado para reposição hormonal em mulheres na menopausa. Nos EUA, o produto gerou uma ação pública, movida por 14 mil pessoas, que acusam a droga de aumentar o risco de câncer de mama.
Para garantir opiniões positivas sobre a substância, a Wyeth pagava para empresas especializadas produzirem textos que ressaltassem suas qualidades -algumas não comprovadas- e escondessem efeitos colaterais, como casos de câncer.
O material pronto era oferecido a pesquisadores "de verdade", que assinavam como autores do trabalho. Essas "pesquisas" eram submetidas a diversos periódicos científicos, que publicavam o material como se fosse independente. Alguns acabaram em veículos renomados, como a "Archives of Internal Medicine".
A mecânica completa do esquema é apresentada pela médica americana Adriane Fugh-Bergman, da Universidade Georgetown, na revista "PLoS Medicine". Fugh-Bergman se debruçou sobre 1.500 documentos confidencias da Wyeth -liberados sob ordem judicial para a revista.
A papelada contém rascunhos de artigos, troca de e-mails e até a contabilidade do esquema.
Em um dos e-mails, uma funcionária da DesignWrite -principal empresa contratada pela Wyeth- descreve o trabalho a um pesquisador.
"A beleza deste processo é que nós nos tornamos o seu pós-doutorando! Nós fornecemos um rascunho geral, ao qual você sugere mudanças e revisa. Nós então desenvolvemos um rascunho com os contornos gerais. Você tem todo o controle editorial sobre o trabalho, mas nós lhe forneceremos materiais para crítica e revisão."
Segundo Fugh-Bergman, a realidade era bem diferente: eles só podiam fazer mudanças simples e que não descaracterizassem as mensagens de marketing pretendidas pela farmacêutica.
IMORAL, E DAÍ?
Usar "escritores fantasmas" não é ilegal, embora seja considerado antiético.
As empresas aproveitam uma brecha na regulamentação nos EUA. A FDA (agência responsável pela liberação de remédios) não considera artigos científicos como marketing. Ou seja: o que acontece nesse espaço não faz parte da sua área de atuação.
De acordo com o artigo, não existem evidências de que os autores foram pagos para assinar os trabalhos.