Publicado em: 22/02/2011
Especialista explica que esse tipo de medicamento é procurado por ter ação rápida; abuso pode resultar em prejuízo para a qualidade de vida
O brasileiro está recorrendo mais do que nunca aos calmantes. Especialistas alertam que o hábito já pode ser considerado um grave problema de saúde pública. Uma das causas do problema, de acordo com o presidente da Sociedade Paranaense de Psiquiatria, Marco Antonio Bessa, é a falta de informação científica entre os profissionais, o que resulta em prescrições equivocadas desse tipo de medicamento.
Bessa alerta que os calmantes podem causar dependência, além de trazer uma série de efeitos colaterais que prejudicam a qualidade de vida. ''Devem ser indicados por um período curto e, de preferência, por um psiquiatra'', destacou Bessa, que é especialista em dependência química e doutor em psiquiatria.
Outros fatores que influenciam no consumo de calmantes são a propaganda que a indústria farmacêutica faz junto aos médicos e a ação rápida que esses medicamentos têm diante de sintomas como a ansiedade. O psiquiatra ressalta que ainda existe preconceito contra quem sofre com problemas emocionais. ''Se a pessoa precisa procurar um psicólogo ou um psiquiatra já dizem que ela é louca. Precisamos quebrar esse tabu'', pontua.
Por que o brasileiro está recorrendo cada vez mais aos calmantes?
Vários fatores fazem com que um medicamento seja mais ou menos vendido. A propaganda que a indústria farmacêutica realiza com os médicos é um fator que interfere bastante nesses números. Com isso, principalmente os médicos não especialistas acabam sendo informados sobre o medicamento apenas pela indústria farmacêutica, tendo pouca informação baseada na literatura científica. Quem mais prescreve os calmantes são clínicos gerais ou de outras especialidades, como ginecologistas, cardiologistas, endocrinologistas etc. Os psiquiatras são os que menos receitam porque têm informações mais fundamentadas sobre as condições adequadas para indicar o medicamento, o tempo de uso, a dose.
Então qualquer médico pode prescrever calmantes?
Sim, desde que tenha o receituário específico. Isso resulta em uso desnecessário do medicamento. Os calmantes têm ação rápida, diminuindo a ansiedade e a angústia. Por essa razão, o paciente busca o remédio sem recorrer ao tratamento adequado. É muito comum a mãe que já usou o medicamento falar para a filha tomar. Isso acontece sem a referência de um médico.
O problema também é decorrente da automedicação?
Sim. A pessoa que se sente ansiosa e angustiada para enfrentar uma situação procura um meio para ajudá-la a se sentir melhor. A publicidade induz as pessoas a pensarem que existe uma solução fácil para todos os problemas. A pessoa usa uma vez, se sente bem e começa a repetir o processo. As mulheres são as que mais usam calmantes. Os homens, para diminuir a ansiedade e a angústia, acabam fazendo uso de cigarro e de bebida alcoólica.
Esses medicamentos podem causar dependência? Quais outros malefícios o uso inapropriado pode acarretar?
A dependência acontece se a pessoa utilizar o medicamento por um tempo prolongado, que é acima de três meses, e em doses excessivas. Se o paciente utilizar o remédio com uma boa orientação médica, por tempo restrito e em dose segura, não vai criar dependência. Quem fica dependente tem uma qualidade de vida ruim, pois esses medicamentos também trazem efeitos colaterais, como a diminuição dos reflexos, alteração de memória, problemas com o sono, pior rendimento profissional etc.
Quando a pessoa tem um problema emocional ela deve procurar um especialista. Ainda existe no Brasil um certo preconceito contra quem sofre com problemas emocionais. Se a pessoa precisa procurar um psicólogo ou um psiquiatra já dizem que ela é louca, o que não tem absolutamente nada a ver. Precisamos quebrar esse tabu. Os psiquatras tratam na grande maioria das vezes de problemas emocionais e não de loucura.
Em quais situações os calmantes são realmente necessários?
São próprios para situações de ansiedade e angústia, como os transtornos de pânico e estresse pós-traumático. Os calmantes devem ser indicados por um período curto, no máximo quatro semanas, e de preferência por um psiquiatra. Somente em exceções a pessoa pode usar por um período mais prolongado, mas sempre em doses baixas.
A falta de fiscalização na comercialização colabora para a venda indiscriminada?
A Anvisa melhorou bastante a fiscalização nas farmácias. No ano passado a venda de antibióticos passou a acontecer somente mediante a entrega da receita. Isso mostra que a fiscalização melhorou. Mas existe um mercado negro, que possibilita o acesso da população a medicamentos e anfetaminas. Esse é um problema grave no Brasil.