Centro concentra 26% dos mocós

Publicado em:  15/03/2011

Os bairros centrais de Curitiba concentram um quarto dos 142 imóveis abandonados na capital paranaense que estão ocupados irregularmente ou são usados como ponto de consumo de drogas. É o que aponta um levantamento da Secretaria Municipal de Urbanismo (SMU) baseado em denúncias apresentadas pela própria população e confirmadas em vistorias. Para a polícia, essas construções – popularmente conhecidas como mocós – estão diretamente relacionadas à ocorrência de delitos no entorno de onde elas se localizam.

Enquanto 37 desses imóveis estão localizados em 20 bairros da Regional Matriz, como Centro, Alto da XV, Batel e Mercês, outras 105 construções abandonadas estão divididas em oito regionais. Além dos mocós, o Centro possui mais de 30 prédios vazios ou subutilizados, segundo pesquisa da arquiteta e urbanista Fernanda Pereira Souza, com base em dados do Instituto de Pesquisa e Pla­­­nejamento Urbano de Curitiba (Ippuc), feita para seu projeto de conclusão de curso na Univer­­­sidade Federal do Paraná em 2009.

A maioria dos mocós levantados pela SMU é de construções em ruínas, marcadas pelo acúmulo de entulhos e sujeira e que atraem usuários de drogas. Entre­tanto, parte desses imóveis também é ocupada por sem-teto. Esse é o caso de uma casa depredada no número 1.042 da Rua Ubal­dino do Amaral, no Alto da XV, que abriga há cinco meses três “moradores” no único cômodo ainda coberto. A situação causa medo aos moradores de um prédio residencial ao lado, que contam que a construção também é usada para a prostituição.

Descaso

A construção abandonada sob o Viaduto do Capanema também faz parte do levantamento. O caso é emblemático pelo fato de o imóvel ser da prefeitura. Em junho de 2010, a Gazeta do Povo mostrou que o local estava em completo abandono e era frequentado diariamente por usuários de drogas. De lá pra cá, nada mudou. Seis pessoas moram de maneira improvisada no local há pelo menos seis meses. Entre elas estão Marcelo Oliveira, 49 anos, e sua filha Vanessa Oliveira, 22 anos, grávida de cinco meses, que vieram de São José dos Campos (SP) atraídos pela propaganda de “cidade modelo”. Sem documentos e emprego, eles conseguem R$ 400 por mês com a venda de recicláveis e sonham em sair de lá.

Desde a metade de 2009, o local está sob responsabilidade da Secretaria Municipal do Meio Ambiente (SMMA). No ano passado, a pasta informou que pretendia implantar ali um Parque de Reciclagem. Entretanto, o projeto não saiu do papel e a SMMA abriu mão do espaço para a Urbanização de Curitiba S/A (Urbs) que, por sua vez, não sabe dar detalhes do que será feito. Entre 2009 e 2010, o lugar foi palco de quatro homicídios.

“Esses locais são usados por pessoas que consomem drogas. Quando o entorpecente acaba, elas precisam de recursos materiais para sustentar o vício. Por isso, acabam recorrendo a furtos e até mesmo a roubos para conseguir dinheiro”, diz o delegado da Delegacia Furtos e Roubos de Curitiba, Rodrigo Brown de Oliveira.

Fiscalização

De acordo com a SMU, se as condições de abandono de um imóvel e o uso indevido forem constatados, o proprietário é notificado para providenciar a vedação total do local, impedindo o acesso ao terreno. Caso as alterações não sejam feitas, o responsável é multado em R$ 537. O diretor do departamento de fiscalização, José Luiz de Mello Filippetto, diz, no entanto, que a solução do problema esbarra em um aspecto: a maioria destes imóveis está em processo de inventário ou pertence à massa falida de empresas. “Não conseguimos encontrar quem se responsabilize pelo imóvel. A solução é demorada e difícil, o que faz com que o problema se prolongue”, avalia.

Solução esbarra em burocracia

A reocupação de imóveis vazios ou subutilizados é uma medida fundamental, defendida por urbanistas e ativistas da luta pela moradia, para evitar a formação de mocós e revitalizar áreas centrais, além de ser uma alternativa para suprir a falta de terrenos para a habitação social nas grandes cidades brasileiras. A ideia é válida, mas trava no fato de que esses imóveis são propriedades privadas, muitas vezes enroladas em processos judiciais.

Embora alguns mecanismos aumentem a capacidade de intervenção do município, eles precisam de regulamentação específica. Na sexta-feira passada, outra reportagem da Gazeta do Povo mostrou que um desses mecanismos é o Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU) progressivo. Proprietários de imóveis abandonados ou subutilizados teriam um prazo de cinco anos para adequar as propriedades sob a pena de ver o imposto aumentado em até 15%. Com o fim do prazo, o imóvel poderia ser desapropriado.

“Curitiba tem um movimento forte pela moradia, mas não voltado para a região central”, avalia o professor do mestrado e doutorado em Gestão Urbana da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) Tomás Moreira. Em Curitiba existe apenas um projeto de lei, do vereador Tico Kuzma (PSB), em trâmite na Câmara.

Outro mecanismo seria algo parecido com a transferência de potencial construtivo, que Curitiba tem hoje para novas construções, para o proprietário que investir em imóvel de interesse cultural, preservar área verde ou mesmo destiná-lo à habitação social. “Seria algo parecido ao que existe na França. Em que o governo oferece um subsídio para o dono de um prédio que quer reformá-lo conforme o uso futuro: habitação ou aluguel social”, explica a arquiteta e urbanista Fernanda Pereira Souza que estudou o tema para sua monografia de conclusão de curso.

Segundo o supervisor de planejamento do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc), Ricardo Bindo, boa parte de incentivos como esses estão em teste nos 216 imóveis do entorno do Paço Municipal. “É preciso aguardar e avaliar para depois pensarmos em ampliar os incentivos e mecanismos para outras partes da cidade.”

Revitalização feita a partir de parcerias público-privadas

Depois de um semestre de andanças pelo Centro de Curitiba e de encontrar mais de 30 prédios vazios na região, a arquiteta Fernanda Pereira Souza propôs em seu projeto de conclusão de curso pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) a reocupação dessas edificações para a habitação social como uma das soluções para a revitalização da região.

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