Alckmin afirma que PM errou ao usar violência

Publicado em:  24/05/2011

Polícia e GCM abriram investigação para apurar abusos na Marcha da Maconha

PM afirma que houve apologia ao uso de drogas e princípio de tumulto e, por isso, agiu "de forma enérgica"


O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), disse ontem que os participantes da Marcha da Maconha, realizada na capital no último sábado, erraram ao prejudicar o trânsito, mas que a polícia também errou ao usar violência.
"Um erro não justifica o outro. A polícia tem competência para lidar com essas questões (...) sem cometer violência. Não compactuamos com isso. Vai ser averiguado se houve excesso", afirmou Alckmin.
Durante a manifestação, que reuniu cerca de 700 pessoas na avenida Paulista e na rua da Consolação (região central de São Paulo), houve confronto com a polícia, que usou bombas de efeito moral e balas de borracha.
Pelo menos dois manifestantes e um policial ficaram feridos no conflito e três pessoas foram detidas -mais tarde, liberadas.
O repórter da TV Folha Félix Lima -que usava crachá- foi atingido por jatos de spray de pimenta e atacado com um golpe de cassetete por uma agente da Guarda Civil Metropolitana.
A PM informou, em nota, que instaurou sindicância para apurar "abusos" na manifestação e a Secretaria Municipal de Segurança Urbana disse que a Corregedoria da GCM abriu processo para verificar irregularidades.O secretário Edsom Ortega afirmou que "não existe uma orientação para a GCM agir dessa maneira".
A PM diz que houve apologia ao uso de drogas e princípio de tumulto entre grupos contrários e, por isso, agiu "de forma enérgica".

A FAVOR DA MARCHA

Protesto é parte da democracia, diz advogado

DE SÃO PAULO

Theo Dias, professor de direito penal da FGV, diz que marcha é democrática. 


Folha - O que o sr. acha da proibição da marcha? 
Theo Dias -
Um erro. O direito de questionamento é parte da democracia. Ou não teríamos tido o movimento feminista, o a mbientalista e outros. A democracia deve ser forte para comportar o questionamento das regras.

Mas, uma vez proibida pela Justiça, os manifestantes fizeram bem em mantê-la?
Se é pacífica, não importa a pauta.

É apologia ao crime?
Então [o ex-presidente] FHC tem praticado crime diariamente. Sem questionamento, a sociedade se engessa. Se o homossexual, a mulher e o negro têm direitos é porque as pessoas puderam exercer o direito de questionar a legalidade.

E a reação da PM?
Pouco profissional. O objetivo da polícia diante de uma demonstração democrática é evitar distúrbios. Tem que estar preparada, presente para garantir a ordem, evitar o uso da violência, excessos. Na medida em que age de forma afoita, detona o processo da violência.

CONTRA A MARCHA

Justiça não teve opção a não ser proibir, diz coronel

DE SÃO PAULO

Para o coronel reformado da PM José Vicente da Silva Filho, consultor em segurança pública, a Justiça acertou ao vetar a manifestação. 


Folha - O que o sr. acha da proibição da marcha?
José Vicente da Silva Filho -
A maconha é proibi da. Enquanto for assim, não outra interpretação a não ser proibir qualquer forma de apologia a ela.

Proibir a manifestação não é uma forma de censura?
Não porque a manifestação é para discutir a liberação ao consumo. A discussão não tem que ser colocada em marcha, mas no devido foro, o Congresso.

E a reação da PM?
Conflito de rua é sempre inesperado. Só uma parte tem direito a usar a força: o Estado, representado pela polícia. Estão sendo abertos procedimentos para verificar se houve uso da força além do necessário.
Sobre a legitimidade da ação, não há o que questionar: a polícia recebeu uma ordem, fez o serviço. Manifestantes se excedem e é difícil fazer a contenção, a não ser com o uso da força, eventualmente fazendo detenções, usando o gás, cassetete -toda polícia do mundo democrático tem esse instrumental.

Editoriais

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Direitos espancados

As cenas de agressão policial a manifestantes da Marcha da Maconha e a jornalistas que cobriam o evento, na avenida Paulista, são resultado da visão embotada de alguns juízes, incapazes de distinguir entre a liberdade de expressão e a apologia ao crime.
A decisão de um desembargador de proibir a marcha não é a primeira. Desde 2008, a Justiça vem barrando manifestações semelhantes. O teor das decisões ao longo dos últimos anos é quase idêntico -alegam não se tratar de um debate de ideias, mas sim de uma iniciativa para o consumo público coletivo da maconha.
O argumento é falacioso. Os juízes não têm como saber, de antemão, se os participantes estarão lá para consumir substâncias ilícitas. Se isso vier a ocorrer, devem ser tratados de acordo com a lei vigente no país, mas a mera possibilidade não pode servir de base para a proibição de manifestaçã o legítima a favor de uma ideia, por controversa que seja (legalização de droga considerada "leve").
Tais determinações judiciais parecem ignorar, também, que existe um debate muito mais amplo na sociedade, não restrito apenas a usuários e especialistas, em torno do que fazer em relação à complexa questão das drogas.
Relatório de 2009, de um grupo liderado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e por colegas da Colômbia e do México, defendia que a guerra às drogas fracassou e cobrava um debate público sobre alternativas, inclusive a descriminalização. No final do ano passado, foi o governador do Rio, Sérgio Cabral, quem se posicionou pela discussão acerca da legalização das drogas leves.
Proibições a manifestações pacíficas e sem objetivo declarado de ferir a lei não vão frear o debate. Servem apenas, como foi o caso em São Paulo, para favorecer a exibição de despreparo das forças de segurança, que agiram com inaceitáv el truculência, sob o pretexto de cumprir ordem judicial.
Duas ações no Supremo Tribunal Federal, em andamento desde 2009, contestam pontos da atual legislação empregados nas decisões dos juízes para proibir as manifestações por suposta apologia ao consumo de drogas.
O STF deve manifestar-se o quanto antes e cumprir sua função de garantidor da Constituição, que ampara de modo inequívoco o direito à liberdade de expressão.


 


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