Legalizar drogas é respeitar escolhas

Publicado em:  05/06/2011

TENDÊNCIAS/DEBATES

 


MARCOS FERNANDES G. DA SILVA

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A legalização diminuiria sensivelmente o tráfico de drogas e a
rentabilidade do crime; a política repressiva gera aumento dos
lucros




O uso de narcóticos é antediluviano, como mostra
brilhantemente Richard Davemport-Hines em seu clássico "The Pursuit of
Oblivion". Por essa razão, deve-se lidar com esse fato com realismo e sem
qualquer preconceito.
Fernando Henrique Cardoso, corretamente, defendeu
recentemente a liberalização da maconha para consumo próprio, alinhando-se com
alguns ex-presidentes latino-americanos e com Mario Vargas Llosa (Nobel de
Literatura 2010).
Todavia, há que se ter um debate envolvendo todas as
drogas.
A vida de um viciado e de sua família é um fardo. O consumo delas
possui efeitos colaterais, físicos e sociais, é fato. Mas apenas poucos usuários
tornam-se viciados, inclusive os de drogas ditas "pesadas".
Mesmo assim, a
dependência, que psicológica seja, é prejudicial, como no caso das drogas
legais.
Mas o consumo e a venda de drogas vêm acompanhados de corrupção e
violência. A melhor solução para esses problemas talvez seja a legal ização dos
mercados.
Os economistas conservadores Milton Friedman (Nobel, 1976), já
falecido, e Garry Becker (também Nobel, 1992) são defensores da legalização do
mercado de todas as drogas devido a dois argumentos, um prático e outro
ético.
O primeiro argumento é que ela diminuiria o crime. Isso é relativo:
essa é uma atividade especializada e, portanto, os criminosos migrariam para
outros mercados ilegais com a descriminalização.
Contudo, os lucros do
tráfico são enormes, incentivando essa atividade ilegal mais do que outras. Por
exemplo, a cada ano, entram na Europa e nos Estados Unidos algo em torno de mil
toneladas de cocaína pura, que rendem uma margem de lucro de 2.000% ao
atacadista.
A proibição do mercado cria incentivos tortos, e a política
repressiva gera o resultado oposto ao almejado: aumento do lucro dos
traficantes. O consumo de drogas vai ocorrer de qualquer forma; melhor então que
o mercado seja legal.
A legaliza ção diminuiria sensivelmente o tráfico de
drogas e a rentabilidade do crime. Ela também geraria o benefício da regulação e
da arrecadação tributária, cujos recursos seriam usados para combater a demanda
no longo prazo, via informação ao consumidor.
O segundo argumento está
fundamentado em John Stuart Mill, filósofo, lógico e economista clássico inglês.
Ninguém tem o direito de violar a liberdade de uma pessoa, nem o Estado: se um
indivíduo, com autonomia, vai fazer algo que o prejudique, tanto faz, isso é um
direito inviolável dele, desde que as suas ações não causem danos para os outros
indivíduos.
A legalização do mercado de drogas é um mal, mas menor e
necessário. Do ponto de vista moral, contudo, trata-se, nesse caso, de respeitar
a autonomia e a liberdade de escolha individuais.



MARCOS FERNANDES G. DA SILVA, economista da FGV, é autor
dos livros "Ética e Economia", "Economia Política da Corrupção no Brasil" e
"Formação Econômica do Brasil: Uma Reinterpretação
Contemporânea".
E-mail: mfgdasilva@uol.com.br.


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