Publicado em: 06/11/2011

Com 3.433 mortes, estado registrou em 2010 a maior mortalidade em acidentes automobilísticos desde 1996, segundo o Ministério da Saúde
Em média, nove pessoas morreram por dia no Paraná, no ano passado, em decorrência de acidentes de trânsito – o equivalente a um óbito a cada duas horas e meia. Ao todo foram 3.433 mortes, uma alta de 9,5% em relação a 2009, segundo números do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde. Foi a maior mortalidade no trânsito do estado desde o início da série histórica, em 1996, quando 3.188 pessoas perderam a vida em colisões ou atropelamentos. Nos últimos dez anos houve um crescimento de 37% no número de óbitos.
Proporcionalmente à população, a taxa paranaense também é alarmante: são 32,9 mortes para cada 100 mil habitantes. É o quinto pior índice do país, atrás apenas de Rondônia, Tocantins, Mato Grosso e Piauí, respectivamente. Em 2001, a taxa era de 26,1. As cidades que mais registraram mortes foram Curitiba, com 400; Londrina, com 191; e Maringá, 162.
Segundo o SIM, o Paraná acompanhou o crescimento das ocorrências no país na década. Se em 2001 o Brasil registrou 30.524 mortes, no ano passado este índice saltou para 40.610 – uma alta de 33%. A taxa passou de 18 para 21,3 óbitos a cada 100 mil pessoas.
Para especialistas em trânsito, o número de mortes é assustador e é resultado de falhas na fiscalização de normas como a Lei Seca e da escassez de investimentos no setor, como manutenção de rodovias e ruas. “Faltam políticas públicas para tratar essa tema, que traz reflexos em outros setores, como saúde e economia”, afirma a coordenadora do grupo de pesquisa de trânsito da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Alessandra Sant’Anna Bianchi. Segundo o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), o custo anual com acidentes no Brasil se aproxima de R$ 28 bilhões.
Frota crescente
A alta nas ocorrências de trânsito também é reflexo do aumento no número de veículos. Em 10 anos, a frota brasileira dobrou. Passou de 31,9 milhões para 64,8 milhões em dezembro de 2010. No Paraná, a situação é semelhante. Se, em 2001, o estado tinha 2,5 milhões de veículos, hoje são 5,1 milhões de automóveis, motos, ônibus e caminhões em circulação. Ou seja, mais veículos nas ruas, mais acidentes de trânsito.
Para Alessandra, as autoridades públicas precisam adotar medidas sérias para tratar o problema e não apenas soluções “tapa-buraco”. “É necessário mais rigor na lei. O motorista tem de saber que se dirigir alcoolizado, por exemplo, vai ser de fato punido. O governo deve assumir sua função e aumentar a fiscalização”, argumenta.
Segundo Hartmut Günther, professor da Universidade de Brasília (UnB) e especialista em trânsito, de nada adianta existir uma determinação no papel se na prática não há fiscalização. “É necessário tratar as pessoas que dirigem colocando em risco a vida de outras pessoas como criminosos, principalmente se estiverem sob efeito de álcool”, ressalta. Günther ainda afirma que nem todos os motoristas respeitam as leis porque sabem que não serão punidos. “A primeira coisa para reverter a situação é aplicar a lei e pôr fim à impunidade. Para isso, é necessário que o trânsito seja tratado com seriedade pelos governantes”, afirma.
Investir mais em educação é a saída para reduzir mortes
O Brasil precisa investir mais em educação no trânsito para diminuir o número de mortes em acidentes. Para o presidente da regional do Paraná da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), Jacks Szymanski, esse deve ser o primeiro passo. “É fundamental alertar as pessoas sobre os riscos que o trânsito traz à sociedade”, diz.
Segundo ele, as campanhas de educação devem contemplar tanto crianças quanto adultos. “Todos devem ter noção do que pode e não pode ser feito no trânsito. Mas, paralelamente a isso, é necessário aplicar a lei para punir quem não respeita a legislação vigente. É algo que pode ser feito, mas que exige políticas públicas para reverter essa situação”, ressalta.
O especialista em trânsito e transporte, João Pedro Corrêa, lamenta o fato de não haver medidas educativas no setor. “Não há esse cuidado. No Brasil, não há políticas eficazes para diminuir o índice de acidentes. Deve-se discutir mais isso e ser tratado com prioridade por parte de nossos governantes”, aponta.
Pacto pela Vida visa reduzir total de vítimas até 2020
Os ministérios da Saúde e das Cidades assinaram, em maio deste ano, o Pacto Nacional pela Redução dos Acidentes no Trânsito – Pacto pela Vida. A meta, segundo o governo federal, é estabilizar e reduzir o número de mortes e lesões em acidentes de carro nos próximos dez anos, como adesão ao Plano da Década de Ações para a Segurança no Trânsito 2011-2020, recomendação da Organização das Nações Unidas (ONU), com coordenação da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Outra iniciativa semelhante é o Projeto Vida no Trânsito, lançado em junho de 2010. Participam deste programa as capitais Curitiba, Teresina (PI), Palmas (TO), Campo Grande (MS) e Belo Horizonte (MG).
A medida tem duas etapas. A primeira foi iniciada ano passado e se estenderá até 2012. As cidades selecionadas devem desenvolver experiências bem-sucedidas na prevenção de lesões e mortes provocadas pelo trânsito e que possam ser reproduzidas por outros municípios brasileiros.
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Acidente de carro é algo evitável, aponta especialista
A redução das mortes é possível porque acidentes de trânsito são evitáveis, avalia a professora Alessandra Sant’Anna Bianchi, especialista em trânsito da UFPR. “Não é algo inevitável. É um erro provocado por alguém”, ressalta. Ela diz que as pessoas não dão conta dos riscos no trânsito e, por isso, dirigem com imprudência. “A população deve se conscientizar disso. Mas, sozinha, a pessoa não vai conseguir mudar essa percepção. É responsabilidade do poder público adotar medidas que visem a conscientização dos condutores”, ressalta.
Lei Seca
Em setembro, o Supremo Tribunal Federal decidiu que dirigir sob efeito de álcool é crime, mesmo quando o motorista não causa acidentes ou danos ao patrimônio. O que poderia ser uma medida para reafirmar a Lei Seca, porém, pode não surtir efeito tão rapidamente. “Não há fiscalização e nem punição. As pessoas não são obrigadas nem a fazer o exame do bafômetro. E se são pegas, contratam um advogado e permanecem, em grande parte dos casos, impunes”, afirma o professor da Universidade de Brasília, Hartmut Günther.
O presidente da regional do Paraná da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), Jacks Szymanski, concorda. Para ele, a legislação na prática é ineficiente. “No começo da Lei Seca, em 2008, todo mundo tinha medo de sair dirigindo sob efeito do álcool. Havia casas noturnas que disponibilizavam serviços de vans e de táxis. Mas hoje a lei está frouxa. A fiscalização não é mais tão efetiva quanto antes”, afirma.
Agentes de trânsito
Szymanski enfatiza ainda o fato de que o número de fiscais de trânsito não acompanhou a evolução do número de veículos. “Aumentou a frota, mas a estrutura para monitorar estradas e ruas não foi melhorada”, afirma. De acordo com ele, há ainda inúmeros fatores que provocam óbitos no trânsito, como a falta de sinalização adequada e a má conservação de rodovias.
“Existem estradas, por exemplo, que deveriam ser duplicadas. Isso diminuiria o número de acidentes. Além disso, as estradas não podem viver tomadas por buracos. A sinalização também deveria ser melhorada. Tudo isso – se o poder público tivesse vontade e olhasse para a população – iria reduzir o número de vidas perdidas provocadas por acidentes de trânsito”, opina Szymanski.
