Governo Dilma não reserva verba para crack

Publicado em:  12/01/2012

Apesar de apontar o combate ao crack como prioridade de sua gestão, o governo Dilma não reservou recursos em seu primeiro ano para programas contra a droga.

Os R$ 201 milhões usados em 2011 pelo governo eram uma sobra do Orçamento do ano anterior, quando o governo Lula criou o Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas.

O programa foi apresentado quando a então pré-candidata Dilma citava o crack como prioridade.

Assim como previsto no novo plano do governo, apresentado no mês passado, Lula prometeu ampliar o número de leitos para dependentes químicos no SUS, o que ainda não foi cumprido.

Segundo dados do Siafi (sistema que registra os gastos federais), em seu último ano de governo, Lula usou R$ 127,6 milhões dos R$ 410 milhões disponíveis para o combate ao crack.

O Ministério da Justiça, responsável por gerir o programa, afirmou que os recursos foram aplicados de acordo com a demanda. Agora, o governo Dilma prevê investir R$ 4 bilhões até 2014 contra o crack.

O governo ainda não discutiu como operacionalizar o plano em São Paulo.

O Planalto já está com convênios praticamente fechados com o Rio e Pernambuco -gestões aliadas. Até o final do ano, espera implementar o programa em SP, BA, PR, MG e RS, além do DF. Integrantes do governo disseram à Folha que a ação da PM na cracolândia atrasou as conversas com o Estado, mas até o final do mês Geraldo Alckmin (PSDB) será convidado para aderir ao plano.


Os números do crack


NA CRACOLÂNDIA

210
número de acusados de tráfico presos em 2011

120 kg
total de cocaína ou crack apreendidos no mesmo ano

R$ 1 mi
valor que o tráfico movimenta na região em um mês no tráfico

3 kg
total de crack produzido com 1 kg de cocaína

900%
diferença entre o preço do quilo de coca comprado na Bolívia e vendido na Espanha

Fonte: Denarc


Negócio lucrativo e exploração de miseráveis convivem na cracolândia

Polícia estima em R$ 1 milhão o valor movimentado por mês com a venda da droga na região

Segundo pesquisa da USP com 923 presos acusados de tráfico, maioria é jovem, pouco escolarizada e pobre

O "negócio mais lucrativo do mundo", o tráfico de drogas, e a exploração de miseráveis, que fazem qualquer coisa por um trocado, ainda convivem na cracolândia.

A região, no centro da cidade, que era frequentada por cerca de 600 viciados em crack por dia antes do início da operação policial para dispersá-los, movimentava R$ 1 milhão por mês com a venda da droga, segundo a polícia.

É um valor muito pequeno para um esquema que pode gerar ganhos de 900% desde a produção da cocaína (base para o crack) na Bolívia (principal fornecedora do Brasil) até o mercado europeu.

Segundo a polícia, um quilo de cocaína é comprado a R$ 7.000 na Bolívia e vendido pelo equivalente a R$ 69 mil na Espanha. Não há um dado exato sobre o Brasil.

Depois, a cocaína é partilhada, misturada, transformada ou não em crack e oferecida ao consumidor, num processo de multiplicação dos ganhos.

Mas os grandes favorecidos por esses lucros não são vistos nas ruas.

No ano passado, o Denarc (Departamento de Investigações sobre Narcóticos) prendeu 210 pessoas vendendo crack nas proximidades das ruas Helvétia e Guaianases, no coração da cracolândia.

A grande maioria foi considerada varejista, aquele que faz a ligação entre o produtor e o consumidor.

CRACK SEM BARÃO

Também foram presos donos de laboratórios de refino e produção, mas a polícia não conseguiu estabelecer nenhuma conexão entre eles.

"Não encontramos um barão do crack. Quando é preso o dono de um laboratório, outro surge para suprir à demanda", diz Wagner Giudice, que completa hoje um ano como diretor do Denarc.

Isso não significa que o tráfico seja coisa de pequenos ou amadores, apenas sua parte visível o é.

Segundo Giudice, a polícia sabe que existem até "sócios investidores", pessoas que não querem se envolver diretamente com a droga, mas que financiam o negócio atraídos pela alta rentabilidade.

Maria Gorete Marques de Jesus, do Núcleo de Estudos da Violência da USP, coordenou pesquisa, lançada em dezembro, com presos acusados de tráfico e identificou um perfil que revela pouca idade, baixa escolaridade e situação econômica difícil.

Foram analisados 923 casos. A maioria (54%) tinha de 18 a 29 anos e apenas o ensino fundamental (80%); 61% foram atendidos pela Defensoria Pública, por não poder pagar advogados.

"Falta investigação para saber quem de fato é o traficante em São Paulo. Esses presos são, muitas vezes, pessoas que repassam a droga para sustentar o próprio consumo", afirma Gorete.

Relatos ouvidos na cracolândia dão conta da situação de outros miseráveis. Paulo Novaes, taxista que circula pela região, afirma que sempre é abordado por pessoas "enlouquecidas" pedindo dinheiro. "Outro dia, uma menina que aparentava ter 16 anos me pediu R$ 5. Disse que faria o que eu quisesse pelo dinheiro."

R$ 5 é quanto custa uma pedra de crack.


 


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